Entrevista: Georgia Annes, escritora

Entrevista: Georgia Annes, escritora
  1. O título do livro sugere um caminhar despretensioso e íntimo. Como surgiu essa metáfora e de que forma ela dialoga com os poemas da obra?  

Surgiu da minha conexão com a natureza, da necessidade de estar em contato com minhas emoções e a partir daí, escrever de maneira subjetiva, poemas que conversem com o universo feminino, mas não somente com ele.

  1. Seus versos exploram os quatro elementos da natureza. Como foi o processo de incorporar esses elementos na poesia?

Esse processo é muito natural para mim. Sou uma pessoa que acorda já pensando se o dia está ensolarado, nublado ou chuvoso. Essa sua pergunta me fez lembrar da época que morei em Jericoacoara, em 2017. 

Todos os dias quando acordava, a primeira coisa que fazia era olhar o céu. Se o tempo estivesse bom, já sabia que renderia uma ida à praia, uma caminhada e fotografias, muitas fotografias. E se estivesse chovendo? Bem, dependendo da intensidade, realmente não dando para sair de casa, me atentava ao cenário que me era oferecido, e desfrutava dele da melhor maneira. A natureza é algo muito presente em mim, contemplar ao redor faz parte da minha rotina. Poeta é assim: vê poesia em tudo.

  1. Você menciona o sagrado feminino em sua escrita. Como essa conexão se manifesta nos seus poemas e o que significa para você trazer essa temática para a literatura?

O sagrado feminino habita em mim, me sinto muito à vontade colocando-o em meus poemas. Trazer essa temática e reverenciá-la é uma forma de demonstrar a força, a sensibilidade e a plenitude que é ser mulher.

  1. O livro fala sobre perdas, recomeços e amadurecimento. Qual foi o maior aprendizado para você durante a escrita dessa obra?

Na realidade o aprendizado é diário. Não consigo escrever sobre aquilo que não me atravessa, que não me toca. Muitos dos poemas falam sobre sensações e sentimentos vividos nas perdas, que me trouxeram recomeços, e me proporcionaram amadurecimento. Eu procuro sempre, uma forma de ressignificar a vida, em todas as circunstâncias, através da poesia.

  1. A resiliência e o amor parecem ser fios condutores dos seus poemas. Como a poesia pode ser um caminho para a cura e o autoconhecimento?

A partir do momento em que se está vivo, passando por situações positivas ou não, existe um lugar de encontro consigo mesmo. E isso é uma experiência única. A grandiosidade da vida está no poder da escolha: seguir sofrendo ou tirar proveito das lágrimas derramadas. 

No meu sentir de poeta, tudo pode ser ressignificado: não se tratando de cura, mas de tornar a vida mais leve, buscando o autoconhecimento e aumentando o amor-próprio. Espero que a pessoa leitora consiga tatear essa possibilidade através dos meus escritos.

  1. Você escreve desde a adolescência. Como foi esse percurso até chegar ao lançamento do seu terceiro livro?

Naquela época já escrevia sobre o amor, mesmo sem vivê-lo, apenas o sentindo. A vida me apresentou caminhos diferentes dos que eu desejava percorrer. Queria ser atriz. Cheguei a cursar teatro, mas a vida financeira difícil, me obrigou a trabalhar cedo para pagar a faculdade. Larguei o teatro, me formei e trabalhei muito. Fiquei casada por vinte anos, me separei. E me reencontrei comigo mesma, em Jericoacoara, 2017. Foi quando os poemas voltaram, acompanhados das fotografias. Nem pensava de fato em me tornar escritora. Escrevia e guardava. Escrevia e guardava. Menos as fotos, as fotos eu vendia. 

Regressei desse ano sabático ao Rio de Janeiro em 2018 e passei a atender como terapeuta reichiana, pela minha formação, mas havia uma inquietação em mim. Cheguei a pensar que o que eu fazia não ajudava a ninguém. 

Foi quando me inscrevi no curso Voz ao Sonho com Allan Dias Castro em 2020, plena pandemia. 

E a grande pergunta era: qual é o seu sonho? 

Os exercícios por escrito não deixaram dúvidas. Minhas respostas eram terapêuticas?  Sim, mas repletas de poesia e eu não enxergava isso. 

Até que em algum momento Allan me sugeriu que escrevesse mais, e que talvez atender pacientes não fosse de fato a melhor maneira de ajudá-los e sim, colocar no papel todo aquele turbilhão que existia em mim. Segui o conselho. 

Escrevi tanto que em maio de 2021, já tinha uns três volumes de escritos. Juntei tudo, imprimi, encadernei (sim com espiral etc.) e enviei para ele ler. Era a única pessoa que conhecia, precisava de uma direção. 

Pouco tempo depois Allan me respondeu, através de uma rede social, indicando meu trabalho para alguma editora. Foi nesse momento que me dei conta da necessidade real de escrever e tornar os textos, livro. 

Comecei participando de uma primeira antologia “Acesso Restrito Delas para Elas” e devido a um pequeno equívoco da gráfica, ganhei a participação em uma segunda antologia “Escritas de Si” e os convites começaram a surgir. 

Publiquei meu primeiro livro “A Menina e seus Balões” pela Editora Ibis Libris em 2022. Desde então, frequentando Saraus e eventos literários, surgiu a oportunidade de me apresentar na Flip em 2022 e não parei mais.

Tive meu segundo livro “Onde Minha Poesia te Abraça” publicado pela editora artesanal Arpillera, lançado na Flip em 2023, sendo o quinto livro mais vendido. Este também me abriu portas para as Fli (Flipetrópolis, Fliaraxá, Flipelô).

Em novembro de 2024, tive meu terceiro livro “Pés descalços na areia”, aceito em uma chamada de originais, pela editora Litteralux, com pré-venda a iniciar em março e lançamento presencial em maio de 2025.

  1. Você já participou de diversas antologias e concursos literários. Como essas experiências influenciaram sua escrita? 

Resposta: Participar de antologias foi a minha porta de entrada para o meio literário. Você começa conhecendo editoras, outras pessoas escritoras e o universo se amplia. No quesito concurso, tive a oportunidade de mostrar meu trabalho em vários e um quinto lugar, me trouxe muita visibilidade. Foi como tivesse sido a vencedora e fez com que eu escrevesse mais e procurasse cursos e oficinas para aprimorar minha escrita.   

  1. O que você sente que mudou na sua poesia desde A Menina e seus Balões até Pés Descalços na Areia

Acredito que amadureci como escritora e meus escritos ganharam mais personalidade. Hoje ocupo a página de uma forma mais intensa e meus poemas se tornaram mais sensoriais.

  1. Como sua formação em Psicologia impacta sua escrita e a forma como constrói seus poemas? 

Acredito que o fato de ter sido terapeuta, me põe num lugar de escuta e observação, tendo uma escrita acolhedora e ao mesmo tempo me permitindo estar vulnerável, para que possa extrair emoções e transformá-las em poesias. Coloco em meus poemas, aquilo que gostaria de ler.

  1. Você também é uma das coordenadoras do Podcast Escritoras Mundialmente Desconhecidas. Como essa experiência contribui para sua visão sobre literatura e mercado editorial? 

É um ambiente muito fértil. Aprendo a cada episódio, a cada live, com a história de cada pessoa escritora, editora, sobre marketing editorial, sobre vidas. E, principalmente porque ser escritora e publicar livros no Brasil não é fácil, mas é possível.

  1. Você é uma grande incentivadora da poesia nacional. Como enxerga o espaço da poesia no cenário literário atual?

Organizo eventos literários, rodas de conversas e é uma satisfação quando surge uma pessoa com seu escrito guardado e o lê, pela primeira vez, nesses locais. Sou otimista, acho que tem espaço para todos os gêneros literários. Tem muitas pessoas escritoras lançando seus livros, mostrando seus trabalhos. Acho necessário esse movimento. O mundo precisa de poesia. 

  1. Como foi o processo de publicação com a Litteralux? O que levou você a escolher a editora?

Conheci a Litteralux através de uma amiga escritora e gostei muito do trabalho deles. Através de uma chamada para recebimento de originais, submeti meu livro e ele foi escolhido para publicação. Desde então está sendo um processo muito prazeroso. Eles são muito organizados e a comunicação é perfeita. O fato de terem aceitado uma foto tirada por mim em Lençóis Maranhenses para ser a capa do livro, me deixou muito satisfeita. 

  1. Você acredita que a poesia tem ganhado mais visibilidade nos últimos anos? Acha que as redes sociais têm um papel importante nisso?

Sim, a poesia sempre foi e é um caminho de desabafo, de libertação e acolhimento. Poesia é necessária e isso pode ser conferido diariamente, através das redes sociais, onde vemos mais clubes e grupos de leitura voltados à poesia. 

  1. Você já tem planos para novos projetos ou futuros livros?

Estou organizando o livro em homenagem à minha mãe, que completaria 100 anos em 2026. Está sendo um processo afetuoso de revisitar memórias. 

Também tenho o projeto de um outro livro de poesia que talvez entre em algum concurso. Participação garantida na Bienal do Rio e demais eventos em Pelourinho, Paracatu e Itabira, além da Flip.

  1. Para quem está começando na poesia agora, que conselho você daria?

Participar de grupos de leitura, eventos abertos. Acho fundamental que se faça oficinas, mentorias de escrita, que submeta seus textos à leitura crítica, revisão ortográfica, tudo o que for necessário para que seus escritos se tornem livro. E andem sempre com papel e caneta, a inspiração vem do inesperado. 

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