Entrevista: Nêssa, cantora e compositora

Entrevista: Nêssa, cantora e compositora

1. Como surgiu a ideia de lançar o EP Climão, Vol. 1 em duas partes? O que podemos esperar do segundo volume?

A ideia, na verdade, surgiu diante da atual situação do mercado de streaming. Vejo que as pessoas estão consumindo músicas de maneira muito mais rápida, com muita, muita, muita gente lançando música. Então, é uma competição, querendo ou não, para você ser ouvido, pois tem muita gente lançando música o tempo inteiro. É muito bacana essa democracia que o digital trouxe, de podermos subir nossa música na plataforma com extrema facilidade, mas também ocasionou essa vasta demanda. Assim, é necessário se diferenciar de alguma forma, né? Então, preferi dividir em EPs para ter mais lançamentos, pois tenho vontade de lançar um álbum, mas acho que preciso começar aos poucos. Nunca havia lançado um EP, sempre tive o sonho de lançar algo além de singles, mas, como fiquei muito tempo sem lançar nada, acredito que lançar logo um álbum não seria bacana. Estrategicamente, para mim, acho melhor dessa forma: lançar primeiro um single, depois um EP, talvez outro single, depois mais um EP. E também não com tantas faixas, para que as faixas não se percam, né?

2. As faixas do EP falam de flertes e da leveza dos primeiros estágios do amor. Como foi o processo de composição para capturar esses temas?

Cara, foi algo que aconteceu de forma muito natural, assim, de verdade, porque, como componho minhas próprias músicas, componho as coisas que vivo. As músicas do primeiro EP, que dividi por esse tema, além da vibe do estilo musical, foram escritas quando eu estava solteira; então, foram vivências daquela época, né? Naquela coisa do flerte, da vida de solteira, de estar conhecendo pessoas. Já o segundo EP vai para algo mais profundo, quando você já está muito envolvida naquele sentimento, e aí vêm as decepções. E também, quando você encontra o amor de verdade, que eu trago nesse segundo EP. Vou responder melhor na próxima pergunta, mas sobre como foi o processo de composição, foi algo muito natural, pois, quando você vivencia as coisas, é mais fácil traduzir isso para a sua arte, e acho que traz mais verdade. Então, para mim, foi algo muito natural. É isso.

3. Você explora uma mistura única de gêneros como trap, reggaeton, funk, afrobeats, bregadeira e pagotrap. Como foi o processo de unir esses estilos mantendo a sua identidade?

A ideia, na verdade, surgiu diante da atual situação do mercado de streaming. Vejo que as pessoas estão consumindo músicas de maneira muito mais rápida, com muita, muita, muita gente lançando música. Então, é uma competição, querendo ou não, para você ser ouvido, pois tem muita gente lançando música o tempo inteiro. É muito bacana essa democracia que o digital trouxe, de podermos subir nossa música na plataforma com extrema facilidade, mas também ocasionou essa vasta demanda. Assim, é necessário se diferenciar de alguma forma, né? Então, preferi dividir em EPs para ter mais lançamentos, pois tenho vontade de lançar um álbum, mas acho que preciso começar aos poucos. Nunca havia lançado um EP, sempre tive o sonho de lançar algo além de singles, mas, como fiquei muito tempo sem lançar nada, acredito que lançar logo um álbum não seria bacana. Estrategicamente, para mim, acho melhor dessa forma: lançar primeiro um single, depois um EP, talvez outro single, depois mais um EP. E também não com tantas faixas, para que as faixas não se percam, né?
 
Minha essência está na minha gíria, no meu sotaque, na minha forma de escrever. Produzi esse funk com um baiano, que está em São Paulo, vivenciando o funk, o ÉoCROSSS. Ele colocou uma pitada de baianidade bem discreta, mas presente, que traz essa coisa da identidade. Sempre gostei de trazer isso nas minhas músicas, mas dessa vez quis me desafiar mais. Mas é impossível perder a essência, né? Porque está tudo ali. As pessoas, ao ouvirem, sabem que é uma pessoa baiana cantando, não uma carioca. Eu não forço sotaque.

4. Você menciona que esse trabalho é mais ousado e explora novos estilos. O que foi mais desafiador nessa exploração?

O mais desafiador para mim, de verdade, foi o medo de colocar isso no mundo. Ninguém gosta de falar sobre isso, mas sempre existe, no fundo, o medo do julgamento, do que as pessoas vão pensar. Sou uma pessoa extremamente eclética. Tenho músicas de diversos estilos que nunca lancei, seja por falta de oportunidade ou por não ser o momento. Sou muito eclética; ouço mais rock do que pagodão, que já usei bastante como base para minhas músicas. Fui roqueira na adolescência; ouço música clássica para desenhar, pois sou ilustradora, mas gosto de tudo. Então, acho que o maior desafio foi interno, o medo do que as pessoas iam pensar. Fiz uma reflexão e entendi que ninguém se importa realmente, e você não pode deixar de fazer as coisas. Tem que fazer, sabe? Artistas de fora fazem muito isso, né? Beyoncé lançou um álbum de House, depois um de Country, e ninguém a julga; acham genial. Ela é uma artista e pode fazer isso. As pessoas tendem a nos colocar em caixas, mas, quando você sabe que pode fazer mais, tem que fazer. Canto bem em qualquer estilo; qualquer coisa que eu cante, sei interpretar, e quero mostrar isso com esse trabalho.

5. De que forma sua “baianidade” influencia a sua música, desde o uso das gírias até as batidas?

A baianidade está impregnada em mim; não tem como sair, sabe? Gosto muito da música baiana. Durante muito tempo, insisti em usar referências da sonoridade baiana nas minhas músicas. Neste projeto, estou abrindo a mente, expandindo para outras coisas, por questões estratégicas, para tentar alcançar um novo público. Ainda assim, gosto de trazer uma referência da musicalidade baiana, para ter uma identidade ali e para que as pessoas associem minha origem. Quero sempre reafirmar que sou da Bahia, que aqui tem muita gente boa, mas não quero que isso me limite. Quando a sonoridade não está presente, tento incluir algo na letra, como expressões. Um exemplo é a faixa “Vai com Calma bb”, que é puramente funk, sem influência da música baiana, mas com algumas percussões características daqui. Na letra, fiz uma referência ao “naipe baiano”, sempre tentando colocar algo do meu lugar. Seja na sonoridade ou na gíria, mesmo só cantando, meu sotaque já está ali. E meu tempero, né? Que só a gente tem.

6. Quais histórias da sua vida pessoal mais te inspiraram nas letras do EP?

Essas músicas compus na época em que estava solteira, então refletem o que eu vivia naquela época: fases de flerte, vai e vem, paixonite, e aqueles dramas de relações onde as pessoas fingem não sentir nada. São coisas que acontecem com todo mundo e que eu vivi naquele momento. Transformei isso em música, né? Quando você compõe o que vive, consegue transmitir mais verdade e causar identificação.

7. Além da música, você também cuida da parte visual do projeto. Como foi desenvolver os encartes e o material gráfico para o EP?

A parte visual, para mim, apesar de ser designer e ainda atuar na profissão, mais como ilustradora, no início foi algo que eu não gostava muito de fazer, pois me sentia enferrujada. Porém, desde “Êta”, um single para o qual também fiz a capa, tenho me empolgado em fazer isso, sabe? Apesar de preferir dirigir e ser a diretora de arte, colocar a mão na massa também tem sido interessante. Gosto de ter o controle da minha imagem e dos meus gostos visuais, então tem sido ótimo. Nesse trabalho, tentei trazer uma identidade visual única, explorando a cor vermelha para simbolizar a paixão que permeia o projeto. Nesse primeiro EP, exploro bastante a cor prata, que remete a algo mais frio, à noite, que é a atmosfera do EP, com faixas que flertam com o trap e funk, que remetem ao clima noturno.

8. Acha que seu trabalho como ilustradora e diretora de arte complementa a maneira como você cria suas músicas e se expressa artisticamente?

Acho que essa questão de complementar abrange diversos âmbitos, porque, quando componho uma música, fecho os olhos e imagino um visual para ela. Então, ao escutar “Vai com Calma bb”, fecho os olhos e enxergo a noite, enxergo cores. Ter o potencial de traduzir isso para a arte é um privilégio, pois posso me expressar artisticamente por inteiro, sem delegar nada a alguém. Como designer, é econômico para mim, sendo um trabalho caro, então eu mesma faço tudo. Tenho total controle e é muito divertido também, então acredito que existe uma ligação real de expressão completa.

9. Você já cantou com grandes nomes como Léo Santana, Psirico e Iza, e tocou em festivais importantes. Qual colaboração ou experiência mais marcou sua carreira até agora?

Toda colaboração é importante; você abrange o público, novas pessoas conhecem seu trabalho, portas se abrem. Acho que o mais emblemático foi a parceria com Àttooxxá, na música “Aquele Swing”, que me trouxe muitas coisas boas. A música já foi lançada em 2019, 2020, por aí, e o filme foi ano passado, então colhemos esses frutos até hoje. Recentemente, teve um MTG de funk de “Aquele Swing” com os meninos de BH. Acho que foi o feat que mais abriu portas, deu muito certo, com um match bacana com a banda, Zamba e Yan Cloud, e é um trabalho que gosto muito.

10. Como você vê seu papel na nova cena musical baiana, ao lado de artistas como ÀTTØØXXÁ, A Dama e O Poeta?

A música baiana vive um momento muito bom, com artistas despontando em estilos diferentes do que era comum, como axé. Agora vemos artistas de trap, como Duquesa, e R&B, como Melly, se destacando. Fico muito feliz e esperançosa, pois isso abre portas para que as pessoas vejam a música da Bahia de outra forma, com muitos talentos diversos. Acho que nosso papel é inspirar outros artistas a criar uma cena musical local forte, pois temos o potencial para isso. Sempre pensamos em ir para o Sudeste, mas podemos fortalecer a cena daqui e construir um cenário forte para a música baiana.

11. O que o público pode esperar dos seus próximos lançamentos? Como você imagina que será a continuidade do Climão?

O público pode esperar ainda mais essa atividade da minha parte. Quero mostrar muito do que sou capaz de fazer. Sempre fui muito atrelada ao pagotrap, que era um movimento que achávamos que ganharia muita força. Acabou que não aconteceu, mas queria que as pessoas me enxergassem como uma artista, e não só como cantora de pagodão. Nada contra a cantora de pagodão, mas sei que posso muito mais. Sou uma artista, posso cantar o que quiser, posso cantar qualquer coisa, e quero que as pessoas vejam isso. Vou mostrar com meu trabalho, lançando minhas músicas, minhas composições, meus projetos, porque tenho várias ideias para o ano que vem, que será de muito trabalho, com fé em Deus. Este ano foi mais de entendimento dos próximos passos da minha carreira, mas agora estou em um movimento bacana. Vou lançar bastante coisa, então estou muito empolgada.

12. Como tem sido a recepção do público em Salvador e fora da Bahia? Existe um lugar ou público específico com quem você sonha em se apresentar?

Acho que a gente só consegue ver uma dimensão real no show, né? No momento, não estou tão focada em shows. Estou focando mais no digital, tentando trabalhar melhor meu digital, pois fiquei muito tempo parada, até por questões de saúde mental. Mas agora estou recomeçando. Tinha um empresário; agora estou sozinha, então tudo isso é um recomeço. Focando em lançar essas músicas, conquistar um público novo, porque geralmente a gente sente mais esse retorno ao ir para os shows, onde sentimos como o público está recebendo nosso trabalho. A última vez que senti essa sensação foi no Virada Salvador, quando chamei Maya para cantar comigo “Êta”. Estava todo mundo cantando e dançando, e a gente nem imagina, né? Porque os números dizem uma coisa, mas na rua é outra. Às vezes não temos essa temperatura, e no show essa resposta é imediata. Então acho que só terei essa dimensão quando voltar a fazer shows, sabe?
 
Eu sonho em me apresentar em um festival grande, sei lá, Rock in Rio, Lollapalooza. A gente tem que sonhar alto, né? Eu sempre sonhei muito alto. Acho que é permitido sonhar, né? A gente não paga nada para sonhar, então posso sonhar o quanto quiser. E acredito que tenho potencial para isso, estou trabalhando para isso aos pouquinhos. É um pouco mais difícil por estar onde estou, apesar de ser um celeiro de potência musical. A Bahia não é tão favorável para o artista independente. As coisas acontecem de maneira mais lenta, especialmente quando você não tem uma máquina investindo em você, sem empresário, sem gravadora. É um pouco mais difícil. Um pouco não — é muito mais difícil! Mas sonhar, eu sonho muito alto. Vocês ainda vão me ver lá, naqueles palcos gigantes.
 
 

marramaqueadmin