Entrevista: Flávia Coelho, cantora

1. Flávia, o que a inspirou a criar o álbum “GINGA”?

Ginga nasceu de um desejo de resgatar sonoridades que eu ainda não tinha utilizado nos meus discos anteriores. Nos últimos dez anos pude observar o quanto as composições atuais seguem na velocidade na qual vivemos, o que resulta em músicas que às vezes duram apenas um minuto trinta, até menos. É claro que eu também já tive que me adaptar às famosas “estratégias de mercado”, mas hoje, acredito ter a maturidade necessária para propor ao público músicas onde ele possa com calma desvendar os ritmos e letras que proponho, por isso compus um disco me baseando na importância da construção dos arranjos, e com músicas que duram bem mais que 3 minutos.   

2. Quais memórias da sua adolescência foram mais marcantes na concepção deste álbum?

Tudo o que é relacionado com o que chamo “ A primeira vez”. O primeiro amor, a primeira saída com os amigos, o primeiro baile charme… A adolescência na sua complexidade é o vetor das nossas melhores e piores lembranças, e é sem dúvida uma imensa fonte de inspiração.   

3. Como foi o processo de produção do álbum, especialmente a colaboração com Victor Vagh-Weinmann?

Victor Vagh é um multi-instrumentista de talento que está sempre atento às minhas demandas. Por Ginga, e por todos os outros álbuns, nossa cumplicidade profissional foi o elemento chave dessa colaboração que perdura há mais de dez anos.

4. Você pode nos falar mais sobre a influência das músicas dos anos 90 e 2000 em “GINGA”?

Eu tive muita sorte de crescer em uma família multicultural, meu pai do interior do Ceará e minha mãe de São Luís (MA). Nascida no Rio de Janeiro, meu coração sempre foi  nordestino e minha mente estava sempre voltada para as sonoridades internacionais, tais quais Madonna, Michael Jackson, Beatles, James Brown, as trilhas sonoras das novelas mexicanas, o hip hop…

5. Qual foi a maior dificuldade que você enfrentou ao longo do processo criativo deste álbum?

Do meu ponto de vista a composição de um disco é um desafio visceral no qual o artista tem como obrigação, assumir sua posição em relação ao mundo. Transcrever sentimentos é um exercício que pode parecer simples no começo mas às vezes a mente se recusa a “desabafar” e por isso eu me  joguei nos livros pra me salvar do mar de confusões na qual vivemos hoje, a literatura me trouxe de volta à superfície. 

6. Como a perda de sua mãe impactou a sua música e sua carreira?

Perder um parente é como envelhecer dez anos… esse processo de envelhecimento precoce foi doloroso, mas o melhor dos remédios, o tempo, curou minhas dores e as transformou em criação. 

7. “Mama Santa” é uma homenagem à sua mãe. Qual é a história por trás dessa música?

Mama Santa é um apanhado de frases vindas das mulheres que me cercavam, frases que escutei durante toda a minha adolescência .

8. Como foi a experiência de confiar a mixagem do álbum a colaboradores renomados como Tom Fire e Prince Fatty?

Eu pensei em cada mixeur no momento mesmo em que estava plugando os violões no estúdio, essa touch fazia parte integrante das músicas, amo cada um deles, os conheço e admiro muito o trampo de cada um.

9. Você mencionou que os primeiros vinte anos de vida servem para entender os próximos vinte. Como essa frase se reflete em “GINGA”?

A frase correta é: “vivemos nossos vinte primeiros anos, e os próximos vinte é pra entender os primeiros”. 

10. Quais são suas músicas favoritas no álbum e por quê?

Amo todas, cada uma tem uma emoção diferente, não dá pra escolher qual filho amamos mais …

11. Se você pudesse ser qualquer instrumento musical por um dia, qual seria e por quê?

Um trombone em Bb, no começo  impossível de tocar, depois é só prazer

12. Qual foi a coisa mais engraçada que aconteceu durante as gravações do álbum?

Eu decidi que não faria nenhum vídeo clip pra esse disco. Mesmo que a influência dele esteja diretamente ligada aos anos 90/ 2000, sinto que esse tipo de conteúdo, no meu caso, não agrega nada ao meu projeto. Para trazer algo mais moderno, fizemos o que chamamos de “visualizer”, que são uma espécie de objetos visuais com as letras das canções. Esses vídeos foram todos gravados em apenas uma hora, tive que adaptar o figurino, inventar danças, gestos, tudo! 

13. Se você tivesse que descrever “GINGA” em uma palavra, qual seria?

Prazer

14. Como você vê a influência política na música brasileira atual?

Vejo que várias manifestações artísticas estão novamente ecoando no país, espero que continue assim  

15. Você acha que a música ainda enfrenta censura no Brasil hoje em dia?

Tenho a impressão que os artistas de hoje se exprimem em acordo total com seus próprios sentimentos, mas há anos não frequento o meio artístico brasileiro, e opinar sobre um assunto tão sensível sem estar próxima, me incomoda. Detesto leviandade …   

16. Qual é a sua opinião sobre a atual cena musical brasileira em comparação com os anos 90?

A cena atual é riquíssima, e a bolha foi sim furada de uma certa maneira. Nos anos noventa, dois mil, era impossível fazer um projeto autoral de sucesso sem o famoso “apoio” do caderninho de endereço familiar. Claro que isso ainda existe, mas felizmente o métier se democratizou, e a internet mudou as regras do jogo.

17. Como você descreveria sua evolução musical desde o seu primeiro álbum até “GINGA”?

Eu ainda estou evoluindo, mas se tem uma coisa que mudou bastante foi a minha relação com os arranjos, os instrumentos… Eu aprendi a tocar violão compondo as músicas do primeiro álbum, e a cada  disco eu renovo essa vontade de aprendizado, e de compreensão de uma obra musical. 

18. O que motivou sua mudança para a França e como isso impactou sua carreira musical?

Uma imensa vontade de crescer como mulher e como ser humano, na época eu precisava me distanciar da minha história pra poder construir outras. 

19. Quais são seus planos futuros após o lançamento de “GINGA”?

Tenho uma grande tournée de mais de 100 datas de show até maio 2025, já estarei bem ocupada !