15 mar 2025, sáb

1. Dom, como surgiu a ideia de usar o conceito das cartas de tarô para representar as músicas do álbum “Minha Cabeça”?

“Nasceu com Maria Gabrielly Dantas, mais conhecida como a Preta que Pariu, que é diretora de arte e figurinista. Dentro do processo do disco ‘Minha Cabeça’, por ser tão pessoal, ela captou uma das minhas essências, que é a bruxaria, uma religião de vida. Vale destacar que o tarô no contexto do disco conta sobre o processo de cura emocional. O fato também da minha formação em Tarologia, há mais de dez anos, fez com que a gente refletisse sobre cada faixa do álbum e pensasse nas cartas para representar cada música”. 

2. O que levou você a escolher o brega chique como o ritmo central do seu álbum de estreia?  

“O brega chique é um subgênero do brega, é um bebê do brega. que surge a partir de Dom Santana e Ed Wav, produtor musical pernambucano. O brega chique, por exemplo, já está registrado nos trabalhos de conclusão de curso das universidades e em entrevistas. E agora o brega chique ganha álbum musical, com o objetivo de difundir mais músicas e consequentemente consolidar o subgênero no Estado de Pernambuco”. 

3. Cada música traz uma narrativa emocional profunda. Como foi o processo de composição e seleção dos temas abordados em “Minha Cabeça”?  

“Nas composições, falo da vida real. Há oito anos, comecei a escrever as letras das músicas do ‘Minha Cabeça’, a partir de uma introdução na poesia. O que mais sai é o que nós passamos no dia-a-dia, como emoções e afetos. O brega é um espaço perfeito para falar de emoção, então resolvemos contemplar diversos atos no disco. Primeiro, a sofrência, depois a reflexão e em seguida o amor, o carinho e o prazer. Também passei por um processo de entendimento das próprias emoções para lidar com as relações interpessoais de forma mais leve. Falar sobre a saúde emocional é importante porque melhora e influencia outras pessoas nos movimentos da vida”. 

4. Você menciona que o álbum reflete idealizações românticas e os impactos disso nos relacionamentos. Essas histórias são inspiradas em vivências pessoais?  

“Passei anos com acompanhamento terapêutico, pois é necessário sentir para ser verdadeiro consigo mesmo, tendo realmente soluções que funcionem para a sua melhoria pessoal. Até digo que o disco começa sem o terapêutico, e depois entra no momento já com a terapia. Sem terapia, é uma confusão exacerbada, a partir de referências das novelas e romances. Não que o afeto, o amor e o carinho não sejam reais, mas nem tudo é novela mexicana. Inclusive, tem gente que sofre por criar expectativas próprias”. 

5. O álbum conta com participações especiais de Amun Há e Bella Kahun. Como foi trabalhar com essas artistas pernambucanas do Agreste?  

“Estar com a Amun Há e a Bella Kahun é uma riqueza. A gente realizou um processo criativo harmônico, com uma troca de ideias fluida. As participações somaram para a feitura do disco. Já tinha uma proximidade com a Amun Há, que entra no disco com o gênero brega funk, enquanto Bella Kahun conheci numa roda de negócios do  Festival Coquetel Molotov (PE)”. 

6. Além da música, o álbum tem uma forte conexão com a sua espiritualidade e a bruxaria. De que forma esses elementos influenciaram o processo criativo?  

“A bruxaria também é conhecida como arte mágica. A gente passa por um treinamento para despertar sensações e sentidos que não são estimuladas no dia-a-dia por uma diversidade de motivos ou falta de tempo e conhecimento também. Inclusive, a bruxaria tem seus mistérios. O que posso dizer é que a prática da arte mágica influencia fortemente na música, no visual, na dança, no audiovisual etc. Você acaba ficando sensível por conta do desenvolvimento da bruxaria. Falar de emoções, humor, prazer e relações também é falar de bruxaria. A música ‘Mar do Esquecimento’, por exemplo, destaca um feitiço de esquecimento para com a outra pessoa. O poder é usado como solução para o esquecimento. Tudo isso faz parte do imaginário e da espiritualidade, lembrando que a arte está aberta para todo tipo de leitura”. 

7. Cada faixa segue uma sequência emocional e narrativa, começando com a revolta e terminando com a leveza e a sensualidade. Qual foi a lógica para organizar as músicas dessa maneira?  

“A ordem das músicas do álbum é construída para criação de uma narrativa que desperte a libertação emocional. Muitas vezes a gente se pega com nossas emoções por fortalecer o nosso eu, sem saber quem somos ou por negar algo. Primeiro a gente cutuca a ferida toda e depois vem o respiro do alívio. Assim, a gente pode amar de novo, e de uma forma mais leve. É preciso compreender o que acontece para encerrar ciclos e renovar relações, sendo importante para você e para a outra pessoa”. 

8. O que simboliza a carta de tarô “A Sacerdotisa”, que abre o álbum com a faixa “Mente Aberta”?  

“A sacerdotisa representa os mistérios da intuição. Quando a gente fala dos arcanos maiores falamos do Louco, que é a carta nº zero fazendo um passeio pelos outros arcanos, como o mago, o imperador, o papa etc. Tudo isso é um estágio da vida da pessoa dentro de um pequeno ou grande ciclo. A sacerdotisa é um momento que o louco se depara com a espiritualidade, então é uma carta misteriosa, sempre coberta, dizendo que segredos vão ser revelados e que precisamos ouvir nossa intuição. É um resumo de várias sensibilidades, sejam elas físicas ou espirituais. A música ‘Mente Aberta’ começa com um trio de vozes para trazer textura de humanidade e corpo, até porque estamos falando de cabeça, mente e emoções viscerais e leves. As vozes abrem a mente para a experiência emocional que o álbum proporciona, logo a sacerdotisa é a carta que mais se enquadra dentro desse processo de cabeça e sensibilidade, começando na mente e depois indo para o físico e as emoções”. 

9. O álbum também traz arranjos com violino, beats, percussão e sintetizadores. Como foi o trabalho em conjunto com os coprodutores Ed Wav e Fillipe França?  

“A produção com Ed Wav é uma conexão segura porque já contávamos com outras parcerias, assim como acontece com Filipe França. A gente aprende e ensina juntos durante esses processos de gravação, mixagem e masterização. Aproveito o espaço para listar toda a equipe técnica do ’Minha Cabeça’ – Mariane Batista (voz); Sombra e Ed (contrabaixo); Notlim e Ed (guitarras); Josy Caldas e Ed (percussão); Ed (beats); 

Dom (violino); Ed (piano); Ed (sintetizador); Ed e Dom (coprodução musical); Fillipe França, Ed e Dom (codireção musical); Ed (mixagem e masterização); Cora Fagundes (produção executiva e assistência de direção de arte); Dom (conceito); Mello Brau (arte); Rhaiza Oliveira (direção e edição de fotografia/still); Erlânia Nascimento (edição audiovisual); Maria Gabrielly Dantas (direção de arte e figurino); Cabrochas (acervo); Karoline Souza (beleza); Daniel Lima (assessoria de imprensa); Brenda Bazante e Kananda PX (mídias sociais)”. 

10. A arte visual do disco também é marcante. Como foi colaborar com Mello Brau e Cora Fagundes para criar a estética de “Minha Cabeça”? 

“O artista visual Mello Brau tem uma pegada com a luz que encanta os olhos. Também já havíamos trabalhado juntos. Ele sabe captar bem a ideia a partir dos traços, cores, tonalidades, texturas etc. Já a experiência com a produtora cultural Cora Fagundes sempre me enriquece. Ela tem uma mente excepcional, que ensina com parceria e me ajuda na comunicação interna e externa”.  

11. Em cinco anos de carreira, você lançou diversas músicas e clipes. O que considera como principal evolução artística que levou ao “Minha Cabeça”?  

“Com o álbum ‘Minha Cabeça’ estou me entendendo melhor como artista, e ao mesmo tempo sabendo da responsabilidade. Nos lugares que estou, sinto um novo olhar das pessoas, mais respeito, mais reconhecimento. As pessoas têm me parado na rua para falar sobre o ‘Minha Cabeça”, tanto no Recife como em São Lourenço da Mata. Também artistas das antigas têm elogiado, assim como o pessoal da nova cena autoral, além de profissionais da imprensa. Para mim, é uma transformação a partir desse disco”. 

12. O show de lançamento será realizado no Festival Búkà. O que o público pode esperar dessa apresentação?  

“O público viu muita emoção, com performances e detalhes musicais, curtindo essa pegada do brega chique. Aos poucos, as pessoas vão entendendo a movimentação do brega chique, o bebê do brega pernambucano”. 

13. Como foi contar com o incentivo de órgãos como Funcultura, Fundarpe e Secult-PE para a produção do álbum?  

“O incentivo público é importante para a realização dos sonhos. Você consegue movimentar uma diversidade de profissionais, com remuneração. É essencial para mostrar outras linguagens e aspectos, dando também uma resposta social. Contar com incentivo fortalece os currículos profissionalmente”. 

14. Olhando para o futuro, quais são os próximos passos da sua carreira após “Minha Cabeça”?  

“Depois do ‘Minha Cabeça’, vai rolar mais uma música de brega chique. Em seguida, vamos lançar o EP ‘Identidade’, que já está sendo gravado. Esse EP trará outro aspecto para o brega chique porque falará sobre política social e negritude. Já adianto que tem a participação da trombonista pernambucana Neris Rodrigues. Além disso, haverá a circulação de shows do EP ‘De Pés’ e do álbum ‘Minha Cabeça’ no estado”. 

15. Qual mensagem você espera que os ouvintes levem consigo após ouvir o álbum na íntegra?

“Espero conseguir trazer para as pessoas um alívio de se perceber humano e não se cobrar tanto por questões emocionais. Às vezes a gente quer fazer da melhor forma, agradar todo mundo e isso acaba sendo desgastante. Precisamos lembrar e perceber que errar é humano e faz parte. Não podemos ficar centralizando culpas. Feito isso, o dia-a-dia se torna mais saudável”.