Entrevista: Banda Sagrav

- O que motivou a escolha da Guerra do Contestado como tema central para o novo EP?
Prota Vargas: Max, muito obrigado pela oportunidade de falar um pouco sobre o nosso novo trabalho, o EP ‘Contestado War’. Sempre gostei muito de história, seja ela mundial, brasileira, de Santa Catarina ou mesmo da nossa região de Chapecó. Penso que devemos abordar esses temas para incentivar a galera a buscar informações sobre fatos importantes que aconteceram no nosso país, já que, muitas vezes, temos acesso a muito conteúdo sobre eventos de fora, como a Segunda Guerra Mundial, o Egito, os Romanos, os Vikings, entre outros, enquanto a nossa própria história acaba ficando mais escondida e esquecida.
2. Como foi o processo de composição das letras para abordar um tema tão complexo e histórico?
Prota Vargas: Comecei indo à biblioteca pública de Chapecó e pegando alguns livros sobre o tema. Paralelamente à leitura, também pesquisei bastante na internet, principalmente no YouTube. Há muito material de qualidade sobre o Contestado disponível por lá.
3. A faixa-título passou por várias alterações antes de sua versão final. Como essas mudanças ajudaram a conectar a música à temática do EP?
Luciano Bravo: Na ‘Contestado War’, tivemos que fazer algumas alterações na estrutura da música, letra, tempo/velocidade, com o intuito de alinhar e encaixar da melhor forma possível o tema tratado. Relatar em música um tema histórico é bem diferente de abordar situações do cotidiano pessoal, por exemplo. No cotidiano, você usa a emoção para expressar o que sente, enquanto em um tema histórico é necessário se embasar em fatos e documentos para alcançar um resultado verídico e respeitoso com os acontecimentos.
4. Em “Contestado Men”, vocês exploram o cotidiano das pessoas da época. Como foi o processo de pesquisa para capturar essa essência?
Prota Vargas: Através de livros e documentários, consegui ter uma noção de como era difícil a vida daquelas pessoas que viviam ali naquela época. Com isso, tentei captar e relatar na letra essa “essência” do dia a dia delas, trazendo para a música um pouco da realidade que enfrentavam.
5. “The Monk” traz influências de death metal e um contexto histórico ligado à religião. Como vocês equilibraram o peso da música com a mensagem da letra?
Prota Vargas: Na região, existiam “monges” que não seguiam as regras da Igreja Católica convencional. O Brasil, na época, era uma jovem República, e o papel da igreja na política já não era tão forte como antes. Na letra, incluímos frases como “A República é o regime demoníaco” e “O extermínio da religião é o objetivo do novo regime”, que são exemplos do que os governantes repetiam insistentemente para manipular os caboclos. Esses monges eram andarilhos e tratavam as pessoas utilizando ervas.
Dudu Livi: Em “The Monk”, procuramos contar a história de um personagem crucial na Guerra do Contestado: o monge que curava os caboclos e se tornou uma figura central no conflito. Musicalmente, utilizamos riffs pesados, batidas rápidas e partes mais cadenciadas para refletir a tensão e os dilemas espirituais do personagem, sem perder a energia e a agressividade que o death metal oferece. O equilíbrio entre peso e mensagem está justamente em contrastar a brutalidade do cenário com a figura de alguém que, por meio da fé e do cuidado, se destacou em meio à guerra. Queremos que a música não apenas soe intensa, mas que também evoque a complexidade do personagem e sua importância histórica.
6. A Sagrav incorpora elementos de thrash e death metal. Como vocês definem a evolução da sonoridade da banda ao longo dos anos?
Prota Vargas: Engraçado, pois sempre fui um cara do heavy metal tradicional — coisas como Dio, Iron Maiden, Judas Priest. Inclusive, minha banda anterior, Spharion, seguia esse estilo, e durou uns dez anos! Mas, com o passar do tempo e com a influência do meu amigo Juares, o “Véio”, comecei a ouvir muitas bandas de death metal, e daí é um caminho sem volta (risos).
7. O EP foi gravado no Estúdio do Gere, em Chapecó. Como foi a experiência de trabalhar com Fernando Nicknich e Hugo Vinícius Da Silva?
Prota Vargas: Fernando está comigo desde que montei a banda, foi o primeiro integrante do time. Tivemos nossa primeira banda juntos, então já é uma amizade de longa data. Além disso, é claro, ele é um baita produtor musical. Ele consegue deixar a tarefa de gravação, que geralmente é algo tenso, muito mais leve e divertida. O Estúdio do Gere é simplesmente fantástico, cheio de equipamentos de ponta. A gente também ensaia lá, e o Gere é meu brother há muito tempo, uma pessoa fantástica e do bem. O Hugo fez a master. Gostei do trampo que ele fez com o poderoso Krisiun. Então, não tem muito o que falar, né? (risos).
8. A arte da capa é impactante e complementa o conceito do álbum. Como foi a colaboração com Marcelo Augusto Aparecido?
Prota Vargas: Foi a primeira vez que trabalhei com o Marcelo. Passei uma ideia inicial para ele e, depois disso, deixei ele bem à vontade para criar a arte. Nesse tipo de trabalho, gosto de dar liberdade para a pessoa trazer sua visão e mandar o que quiser. E o cara mandou muito bem, fez um trampo fudido!
8. Desde “The Lynching” (2015) até “Contestado War”, como vocês veem a trajetória da banda e as mudanças na formação?
Prota Vargas: A banda já teve varias formações. Só fica na Sagrav quem está realmente interessado em compor, gravar, fazer shows e toda essa função. Penso que essa atual formação está muito sólida e coesa. Mas sou muito grato a todos os ex-integrantes: Cristiano Zauza, José Paulo Kemper, Rubens P. Melo, Rodrigo Nicknich e Guilherme Luan. Estamos loucos para sair e tocar o quanto antes. A estrada e o palco é a alma de uma banda.
9. Vocês mencionaram que as letras exploravam inicialmente eventos históricos de Santa Catarina. De que forma essa conexão com a história local influencia a identidade da banda?
Luciano Bravo: Buscar o conceito de originalidade, de veracidade, autenticidade, e passar esses conceitos para o público, em letras, e com a força que o estilo da música metal consegue promover. Isso tudo é algo que nos permite ter essa identidade única em relação a tantas bandas e estilos existentes.
10. O single “Death Sentence” foi lançado antes do EP e contou com um videoclipe. Como foi a recepção do público e a experiência de produção do vídeo com Felipe Cassaniga?
Luciano Bravo: Esse clipe, acredito falar por todos da banda, foi a realização de um sonho muito antigo, a produção do Felipe Cassaniga e toda a equipe, foi sensacional, desde a primeira reunião, ele nos ouviu e assimilou as ideias que lançamos. Isso tudo gerou um trabalho que foi muito bem aceito pelo público, não só a galera que curte e segue a banda, mas quem não conhecia nosso trabalho e até mesmo quem nem curte esse estilo de música.
11. Com o lançamento de “Contestado War”, quais são os próximos passos para a Sagrav? Há planos para turnês ou novos projetos?
Prota Vargas: Sim. Estamos agora trabalhando para que, no início de 2025, possamos iniciar um giro por Santa Catarina, divulgando o EP ‘Contestado War’. Também temos planos de ir para os estados vizinhos, como Rio Grande do Sul e Paraná. E, quem sabe, expandir para São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e até o Nordeste, que tem uma cena muito forte no metal.
12. A banda tem como marca abordar temas históricos em suas músicas. Pretendem continuar nessa linha temática em futuros trabalhos?
Prota Vargas: Sim, com certeza. Já estou com alguns temas em mente, como: Piratas em Santa Catarina, Guarda do Embaú e o tesouro enterrado e Massacre de Anhatomirim.
13. O que vocês esperam que os ouvintes levem consigo ao escutar o novo EP?
Luciano Bravo: Essa história é algo que se repete em várias partes do mundo e ao longo das diferentes épocas da história humana. O progresso que vem guiado pela ganância e o desprezo pela vida, eliminando tudo e todos pelo poder e resultado financeiro. Se conseguirmos transmitir essa mensagem às pessoas, fazendo-as refletir e sentir que a nossa atual vida e comodidade foram construídas com muito sangue e sacrifício de muitas pessoas, e que a história nem sempre nos é contada como deveria, já teremos cumprido um grande objetivo.
14. Como é ser uma banda de metal em uma região como Chapecó? Vocês sentem que há um cenário local forte para o gênero?
Prota Vargas: Já foi muito pior (risos). Metade da banda é de Chapecó e a outra é de São Miguel do Oeste (SMO). Então vou falar um pouco de Chapes, e o Luciano comente de SMO. Agora temos muitas bandas de metal em atividade, o que é excelente, mas ainda não temos muito público. Consequentemente, as casas de shows não abrem espaço para as bandas tocarem. No entanto, tem uma galera muito engajada que fazem os festivais Chape In Hell e Creepy Show. Além disso, eu também organizo o Chapecó Metal Fest.
Luciano Bravo: Aqui em São Miguel do Oeste, já tivemos uma cena muito rica, e até poderia ser referência, mas não só a falta de suporte, mas a falta de união entre bandas e público geral, fez com que o metal tenha morrido. As bandas e músicos pararam seus trabalhos ou migraram para outros estilos pra se manter em atividade, caso meu e do batera Roberto Rodrigues, hoje tocamos em vários projetos, todos na linha rock, pop, a grande maioria cover.
15. Se pudessem escolher um tema ou evento histórico para um futuro álbum, qual seria e por quê?
Prota Vargas: Na real, estou bem interessado em três temas que comentei: Piratas em Santa Catarina, Guarda do Embaú e o tesouro enterrado e Massacre de Anhatomirim. Acho que temos o dever de ajudar a divulgar nossa História. “Um povo que não conhece sua História está fadado a repeti-la.” (Edmund Burke).
16. Como a Sagrav busca inovar no gênero, ao mesmo tempo em que mantém sua essência?
Luciano Bravo: É uma tarefa difícil, mas gratificante. Penso que trabalhar com temas que relatam fatos históricos, adaptados ao metal, é a grande receita. Manter-se fiel a esse conteúdo verídico e sempre ser honesto com o público é fundamental.