Entrevista: Mateus L.P. Santos, escritor

Entrevista: Mateus L.P. Santos, escritor

1.⁠ ⁠O que inspirou você a escrever “24 Horas de Amor”? Como Campos do Jordão se tornou o cenário ideal para essa história?

Eu estava de coração partido e acho que a melhor forma de remendar o meu coração é sempre escrevendo. Eu tinha vivido algo incrível com uma garota que eu genuinamente amava — hoje em dia, nós estamos juntos, felizmente —, mas que não tinha futuro na época. E fiquei pensando nesse sentimento que pode ser temporário mas também eterno, e quis mostrar isso na história. E eu queria que o livro se passasse dentro de uma memória, porque aí não dá pra saber se foi tudo daquele jeito mesmo ou se o protagonista está apenas floreando suas lembranças, como acontecem com pessoas nostálgicas como eu. Campos foi uma decisão minha porque poucos meses antes tinha visitado a cidade com uma ex-namorada e foi terrível, mas eu lembro de ter achado a cidade mais romântica que já tinha visto, mesmo pra um casal nada apaixonado.

2.⁠ ⁠Lucas e Ana têm uma conexão instantânea. Você acredita em amor à primeira vista? Como foi criar essa dinâmica entre os personagens?

Eu acredito em conexão à primeira vista, mas não em amor. Acredito em ser levitado do chão, sentir o coração transbordar de carinho por alguém que acabamos de conhecer, mas isso não é amor. Amor é muito mais complexo, muito mais cinza do que preto ou branco. E acho que amor se constrói com o tempo, ele é muito mais ativo do que passivo, passa muito mais por uma escolha do que por destino. No caso do Lucas e da Ana, é uma mistura de coisas. A conexão existe no gosto literário, na solidão compartilhada, na vontade de encontrar ressonância com outra pessoa. E acho que quando conexões assim acontecem, especialmente nas circunstâncias da narrativa, fica mais fácil se jogar no precipício da paixão. Na vida real, eu me joguei e nem estava em Campos.

3.⁠ ⁠O livro é repleto de diálogos marcantes e existencialistas. Como você equilibrou essas reflexões filosóficas com o desenvolvimento do romance?

Essa era a coisa mais interessante de toda a história pra mim. Pra mim, o gênero Jovem-Adulto permite que nós falemos de coisas profundas no meio de histórias relativamente simples e assim é possível alcançar um público-alvo que está pronto para realmente pensar em questões filosóficas, mas por ser um romance YA isso vem de um jeito mais leve, até mais fácil de ser digerido. É o que acho mais fascinante no gênero. Tem uma frase que eu adoro do Pete Holmes: “A risada é o melhor momento para se transmitir uma ideia”, e acho que isso se aplica na leveza desses romances. O equilíbrio veio naturalmente, sempre na voz da Ana, é ela quem dita pra mim o ritmo do existencialismo do livro, apesar de ser o Lucas o formado em Filosofia.

4.⁠ ⁠Seu livro é comparado à trilogia “Before” e a outros romances como “A Probabilidade Estatística de Amor à Primeira Vista”. Quais foram suas influências ao escrever?

A trilogia Before, a minha favorita da vida, é com certeza a maior referência. Sempre adorei histórias baseadas fundamentalmente em diálogos, em personagens andando lado a lado, sempre em direção a um destino que importa menos do que a jornada, com conversas existencialistas e bobas e filosóficas e inúteis. Tem toda uma metáfora no livro sobre o Divino que baseei também no C.S. Lewis, um dos primeiros pensadores a entender que a analogia para Deus precisava estar além do humano.

5.⁠ ⁠Com uma playlist no Spotify e um audiobook, o que você espera que os leitores sintam ao vivenciar essa experiência sensorial?

A ideia é realmente transportar os leitores e ouvintes para Campos do Jordão junto com o Lucas e a Ana. Tentei fazer isso no livro sem usar essas referências sonoras, especialmente nas descrições durante as andanças dos personagens, mas a playlist e o audiobook servem para amplificar isso. Além disso, acho que o audiobook é uma experiência legal para quem não está muito acostumado com o formato, até por ser bem diferente do usual: tem dois narradores, um para cada protagonista.

6.⁠ ⁠Como você se sente com o sucesso do lançamento digital, com mais de 13 mil exemplares baixados? Quais são suas expectativas para a versão impressa?

É uma felicidade enorme, nunca achei que o projeto fosse ter esse alcance. Tinha esperanças, é claro, mas nunca imaginei isso. É legal demais ver as pessoas ressoando com a história, se conectando com os personagens e com as reflexões que eles têm. Todo escritor quer ser lido e todo escritor quer ser gostado. Eu tive sorte o suficiente de sentir as duas coisas dentro do mesmo projeto, isso já é um milagre pra mim. Espero que a versão impressa alcance ainda mais gente, especialmente aquelas que não se dão muito bem com o Kindle, como é até mesmo o meu caso. Não tem alegria maior do que poder entregar um livro seu, impresso, para uma pessoa amada, de verdade.

7.⁠ ⁠Pode nos contar um pouco sobre seu processo de escrita? Qual foi a parte mais desafiadora ao escrever este livro?

Eu sou um jardineiro. Acho que foi o George R.R. Martin quem deu essa definição, dizendo que existem escritores arquitetos, aqueles que pensam em cada detalhe antes de colocar tudo no papel, e os jardineiros, aqueles que vão improvisando enquanto arrumam o jardim e cortam algumas plantas. Eu sou desses. Crio alguns capítulos que gosto de chamar de pontos de parada, são basicamente momentos importantes do livro, ideias que já me visitaram desde o início do projeto. E vou improvisando, sempre na tentativa de escutar o sussurro daquela voz interior que parece saber mais do que eu. A parte mais desafiadora foi achar o equilíbrio entre romance e filosofia. Não queria que fosse só um grande artigo existencialista meu, então tentei incluir bem sutilmente as minhas reflexões filosóficas.

8.⁠ ⁠Como está sendo participar da Bienal do Livro e do lançamento na Livraria Martins Fontes? O que você espera desses eventos?

Pura magia, sério. A Bienal tem sido/foi um momento incrível. Ver meus leitores e minhas leitoras, abraçar essa gente e ter esse contato cara a cara é muito especial. Ainda é doido ver que algumas pessoas me conhecem e ficam nervosas de falar comigo, mas é um sentimento realmente muito mágico ver que a história tem ressoado. O lançamento da Martins promete ainda mais. Na Bienal nem sempre dá tempo de conversar, especialmente aos fins de semana. Na Martins eu espero que isso seja possível, vai ser legal ver o que falou mais ao coração da galera.

9.⁠ ⁠Você está trabalhando em novos projetos ou livros futuros? O que os leitores podem esperar de você nos próximos anos?

Estou, sim. Não paro de escrever nunca. Essa é a coisa mais difícil, na verdade, escrever e esperar tanto tempo para publicar. Meu próximo projeto se chama Estrelas Perdidas, é um romance bem mais extenso do que 24 Horas de Amor, tem mais do que o dobro do tamanho. É uma história que surgiu a partir do luto, quando perdi meu avô. É um romance também, mas acho que ele trata de questões mais complexas do que amor à primeira vista e essa conexão imediata que trabalhei com o Lucas e com a Ana. Ele questiona os recomeços que existem em um amor que ficou para trás, quando os anos já distanciaram as pessoas mais do que qualquer distância física, e como nós podemos seguir em frente quando temos tantos fantasmas do passado nos segurando. É um livro sobre o luto, sobre o amor, e sobre como essas duas coisas sempre caminham juntas. Meus leitores podem esperar muito mais livros. 24 Horas de Amor saiu originalmente há dois anos e meu plano, começando agora em setembro de 2024 com o lançamento físico, é publicar um livro por ano durante os próximos 4 anos. Tenho material o suficiente para isso, vamos ver se dá certo. 

10.⁠ ⁠Que mensagem você gostaria de deixar para seus leitores, especialmente para aqueles que são românticos incuráveis?

Tem uma frase que eu amo do Rainer Maria Rilke em que ele diz que o Amor e a Morte são os grandes presentes que são passados para nós e que a maioria de nós nem abre a embalagem. Amor e morte sempre andam juntos, a gente só ama porque somos finitos. Então eu diria para que as pessoas refletissem sobre isso. A melhor forma de ser presente no hoje, pelo menos pra mim, é a falta de garantia de um amanhã. Isso me ajuda a amar mais, a amar de forma maluca, desordenada, desesperada, como se 24 horas fossem mais do que tempo o suficiente para construir uma eternidade de lembranças. E para os românticos que ainda não encontraram o seu Lucas ou a sua Ana: a sua pessoa está chegando. Existe tempo pra tudo nessa vida, como dizia Salomão, aproveite o tempo de ficar sozinho ou sozinha. Quando for pra acontecer, vai acontecer.

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