Entrevista: Leopold Nunan, cantor e compositor

1. Leopold, o que inspirou o nome do seu álbum de estreia, “Leo From Rio”?
Moro em Los Angeles há 25 anos. A comunidade de Los Angeles que carinhosamente escolheu esse apelido para mim quando eu apresentava um show de música Brasileira Moderna na Rádio Comunitária KPFK 90,7 FM. “Leo from Rio” pegou forte e nos flyers, começaram a usar naturalmente esse nome. Por isso estou chamando o álbum assim. Eu amo porque tem uma rima que dá um ritmo ao nome. Aqui eles pronunciam “Liiiio from Riiiiio” eu me amarro!
2. Como foi o processo de gravação do álbum durante a pandemia?
Com a distância entre o Brasil e os EUA eu já estava trabalhando tudo remotamente do meu home studio em West Hollywood pro Mundo até antes da pandemia. Durante a pandemia esse álbum me salvou da insanidade provocada pela quarentena. Eu mergulhei de cabeça e dediquei tudo a essa obra. Eu tive muita sorte porque a “Music Forward Foundation” se juntou ao Citi para escolher 10 artistas independentes LGBT para ganhar um edital e eu ganhei 10 mil dólares deles – o único Brasileiro no meio dos vencedores. Com esse dinheiro, consegui terminar o álbum e mixar. Trabalhei com multi instrumentistas e arranjadores como o prodígio de Belo Horizonte Alberto Menezes que eu conheci na América enquanto ele estudava música. Também tive a honra de trabalhar com o produtor baiano Lucio K e a masterização de algumas músicas do gênio Carlos Trilha.
3. Você mencionou que o álbum é uma homenagem ao seu pai. Como a memória dele influenciou seu trabalho neste projeto?
Meu pai nasceu no Piauí no meio da música que a minha avó tocava e cantava. Era professora de música em Teresina. Meu pai, Prof. Virmar Ribeiro Soares, era um cirurgião médico que tocava muito bem qualquer tipo de percussão, em especial o pandeiro Brasileiro. Ele me deixou um acervo de mais de 300 vinis clássicos da música brasileira e é o que eu ouço em casa diariamente. Fui criado no meio das rodas de samba, chorinho, repentistas e jazzísticas. Muita dança, cantoria, noites de serestas, saraus. Foi assim que eu cresci ao embalo da rede, com gostinho de siriguela, cupuaçu, bacuri e rapadura.
4. Pode nos contar mais sobre a parceria com o Beto Brown e como ele contribuiu para o álbum?
Nós nos conhecemos na Festa de house music icônica A Body And Soul em Nova Iorque e os dois ainda morando no Rio. Eu me encantei com as composições dele que também vai da felicidade do samba, passa pela irreverência do carnaval e também traz a magia do nordeste. Um compositor talentoso, diretor de teatro e manda muito bem nas composições.
5. O álbum mistura vários gêneros musicais. Como você conseguiu integrar esses estilos diferentes em um só trabalho?
Eu escolhi as músicas que eu mais cantava ao vivo nos meus shows aqui. Eu represento o Brasil toda vez que piso no palco e também entretenho a minha plateia que fala inglês e também em espanhol. Eu tenho um gosto e formação bem eclética de música. Eu amo música dançante também sou apaixonado pela pista de dança. Adoro fazer comédia, então o humor está presente na minha música. Eu tentei reunir a multiplicidade que é viver no mundo de hoje tendo emigrado nos EUA 20 anos atrás. São muitas influências tudo ao mesmo tempo.
6. Qual é a sua faixa favorita no álbum e por quê?
Eu estou apaixonado por todas as músicas, mas a “Quem e teu baby” um coco nordestino está me dando muito prazer de cantar ela ao vivo e Olha que eu já canto ela há 20 anos. Ela tem uma pegada que me lembra do sertão, de boiada, de berrante.
7. Como foi trabalhar com artistas como Sonia Santos e Ana Gazzola?
Uma honra muito grande colaborar com dois ícones da música Brasileira. Nos EUA, Sonia e Ana vêm representando a arte brasileira há décadas pelo mundo afora. Muito orgulho de colaborar com minhas amigas do peito, admiro as duas divas imensamente. O videoclipe que gravamos todo em Los Angeles é uma celebração do afeto na diversidade.
8. Pode nos falar sobre a escolha dos instrumentos e arranjos usados no álbum?
Pela Primeira vez eu tenho a oportunidade de ter instrumentos de câmara e orquestra no meu álbum. A presença do violino intrépido do talentosíssimo carioca Tomaz Soares e instrumentos todos tocados pelo incrível Alberto Menezes. Por exemplo, o pop tropicalista “Pé de Maracujá” mostra a evolução botânica do Maracujá no arranjo sensível de percussão em Tubo de PVC do Alberto Menezes.
9. Quais são seus planos futuros após o lançamento do álbum?
Eu tenho muita vontade de levar esse álbum que já até virou um show super energético para uma tour nacional pelo Brasil inteiro. Realmente é um sonho para mim. Eu também estarei lançando um álbum de remixes, que está incrível com versões dançantes do heavy hitter brasileiro Buarky, do britânico Hectic e do carioca pai do House o veterano DJ Marcão Rezende.
10. Como foi a experiência de cantar na Parada do Orgulho LGBT+?
Eu tive a oportunidade de participar cantando em vários prides na América. Abri para Chaka Khan e Sheila E no lendário Long Beach Pride, eu fui o headliner do Beverly Hills Pride com a Banda do Justin Timberlake e também montei uma escola de samba em West Hollywood para percorrer 5 milhas na parada da cidade. Aqui foi uma honra ter trazido meu show para o cabaret da Cecília que me recebeu de braços abertos e com muito amor.
11. Você começou sua carreira musical aos 19 anos no Rio de Janeiro. Como foi essa trajetória até chegar a Los Angeles?
Meu primeiro single o hit “I’ve got it” que saiu pela gravadora – a primeira de house no Brasil – a UTTER records do pioneiro André Gismonti, tocou em todos os clubes. Eu tinha 17 anos quando gravamos. Eu tinha que ir cantar acompanhado dos meus pais nos clubes do Rio de Janeiro. Quando eu fiz 18 anos, o visionário francês Gilles Lascar, que era proprietário da Boate Le Boy em Copacabana, fez o lançamento da música e foi um sucesso instantâneo. Todos os DJs produtores queriam fazer uma versão da música. Saiu com 11 versões. Foi o máximo! Lembro de tudo como se fosse hoje. Muito amor!
12. Além de cantor e compositor, você também é bailarino, ator e dublador. Como essas diferentes facetas artísticas influenciam seu trabalho musical?
Comecei minha carreira cedo como bailarino e cantor em musicais com a professora e gênio do teatro musical Cininha De Paula no Brasil e também no tablado com o professor Ricardo Kosovski. Aprendi a cantar com a estrela Hilton Prado no Rio. Então essa formação eu levei pra vida. Eu aprendi fazendo. Em Los Angeles eu mergulhei na dublagem e já fiz mais de 300 filmes, desenhos animados, narrações e novelas. Faço parte de um time de elite dos dubladores brasileiros na América.
13. Quais foram os maiores desafios que você enfrentou ao longo da sua carreira e como os superou?
Dinheiro! Tudo custa muito caro! E espaço. É difícil ser um artista independente queer em um mercado dominado por mega artistas e gravadoras. Já sofri todos os tipos de preconceitos. Sou imigrante nos EUA e quando volto pro Brasil sou chamado de gringo. Por ser abertamente orgulhosamente gay, também por ser um artista deficiente que usa aparelhos na perna nos meus shows. O meu trabalho é um desafio ao capacitismo. Eu sou portador de uma doença debilitante motora e hereditária, progressiva e sem cura chamada Charcot Marie Tooth. E outros preconceitos novos também, por exemplo agora me chamam de velho. Acho hilário. Quando que 40 de idade significa ser “velho”? Acho um broto. A cada preconceito eu venho mostrando música, expressão, levando a felicidade e humor nos meus shows. Eu quero provar que nós sim podemos subir nos palcos da vida independentemente de deficiência e qualquer outros obstáculos!
14. Como você vê a situação atual da música brasileira no cenário internacional?
O Brasil sempre esteve na moda lá fora. E agora ainda mais. O nosso ritmo funk está sendo tocado muito em todas as festas e rádios nos EUA. Shows lotados da Anitta, Pabblo Vittar, Liniker, Caetano Veloso e artistas como Gaby Amarantos sendo reconhecidas por lá. É muito encorajador e inspirador.
15. O que você acha sobre a relação entre artistas independentes e grandes gravadoras no Brasil?
(Desculpa não sei muito sobre esse assunto)
16. Como você vê a evolução do movimento LGBT+ na indústria musical?
Estamos galgando nosso espaço rapidamente. Estamos evoluindo dinamicamente e conquistando nosso público com música feita do nosso coração pro mundo. Não há nada melhor que sermos nós mesmos. A música está cada vez mais diversa e múltipla,