1. Como foi a transição do estilo mais voltado para MPB em seus álbuns anteriores para uma sonoridade mais pop e dançante em “Mirantes Emocionais”?
Primeiramente, boa tarde/noite/dia, pessoal do Portal Marramque. Essa transição da MPB para o som mais pop dançante do Mirandas Emocionais veio muito da necessidade e vontade de não repetir as coisas que eu tinha feito antes nos meus três últimos discos e no meu primeiro EP, que giravam muito em torno do violão, da bossa nova e do samba principalmente. E todos os elementos como guitarra, bateria, sintetizadores, baixo, percussões e todas as outras coisas eram mais pinceladas em volta desses estilos musicais brasileiros. Então, todo esse trabalho girava em torno disso. E com esse disco, o Mirandas Emocionais, eu procurei fazer algo que saísse dessa redundância que virou a bossa nova e o samba na minha vida. Mas que também remetesse a eles de alguma forma, e aí eu encontrei o synth-pop e também o pop-rock pra usar eles como expressão artística. Com eles vieram os desafios de pegar todas as referências que eu tinha e colocar de uma forma que uma faixa conversasse com a outra e também tivesse essa expressão mais avante, mais pra frente, não só de composição musical, mas também de estética, que acho que é muito importante hoje em dia. De todas as músicas terem a mesma estética, por isso que a mixagem foi um trabalho bem delicado e atencioso nesse disco. Então é isso, e o uso dessa estética mais pop e mais pra cima veio muito disso, essa necessidade de não se repetir e fazer algo novo.
2. Você mencionou que muitas das faixas do álbum surgiram durante o período pandêmico. Como a solidão desse período influenciou sua criatividade e processo de composição?
Eu acho que o tempo sozinho, de ter todo esse tempo livre na época da pandemia, contribuiu muito para o aumento desse leque de criatividade meu. Passei muito tempo nesse período pesquisando músicas novas, ouvindo coisas novas. Então eu descobri muita coisa nova musicalmente, visualmente, esteticamente, que acho que influenciou muito no processo desse disco. Mergulhei muito mais em synth pop e em música pop no geral. Também saiu um pouco desse foco que eu tinha em samba e bossa nova. Então foi um período muito experimental e muito criativo, que influenciou diretamente no processo de composição desse disco. Indiretamente, as músicas foram o espelho desse processo criativo de absorver muitas referências, muita experiência musical nova. E acho que dá pra ver, isso fica bem claro no disco.
3. “Mirantes Emocionais” apresenta uma variedade de estilos musicais, desde indie pop até elementos oitentistas. Como você equilibrou essas influências diversas ao criar o álbum?
Acho que esse foi o maior desafio do disco, de equilibrar todas essas referências de diferentes estilos musicais, desde o indie pop até bossa nova e também rock. Isso foi um desafio tanto na composição quanto na produção e na mix do disco. Na composição eu acho que eu não colocava muitas regras. O que viesse na minha cabeça, o que aparecesse, eu escrevia até sentir que não valia a pena manter a ideia. E a partir do momento que a ideia era mantida da composição, seja por uma melodia de voz, um violão ou um timbre de sintetizador, eu começava a pensar como isso poderia encaixar com as outras faixas que eu já tinha do disco. E isso na produção com o Lucca Noacco foi o momento que a gente começou a pensar nos timbres de guitarra que a gente usaria e em todas as outras coisas escolhas estéticas de todos os outros instrumentos e em todas as músicas pra ter algo amarrado entre elas e não necessariamente ser o timbre de uma música ou outro timbre de outra música, mas ter uma coisa constante no disco e que unisse essas faixas de diferentes estilos musicais. E o outro desafio disso de unir essas faixas de diferentes estilos foi na mix, que acho que foi o momento que essa cola final mais deu resultado, porque a mix do Kassin foi algo fenomenal, que mudou completamente a cara do disco, fazendo ele ter toda uma ambiência, toda uma sensação diferente do que se fosse só a produção minha e do Lucca, foi ali o momento da produção e da feição desse disco que mais me chamou atenção e que mais gostei de ter trabalhado
4. Pode nos contar mais sobre a formação do Ministério da Consciência e como essa colaboração afetou a direção musical do disco?
O Ministério da Consciência foi uma ideia que eu já tinha guardado há muito tempo, o nome. De ser uma banda no futuro ou alguma coisa que servisse de banda de apoio para meus projetos. E o momento certo foi depois que terminei de gravar e masterizar esse disco novo. Eu vi que era um disco que, diferente dos outros que eu fiz, que tinha muito envolvimento de outras pessoas. Seja na parte musical quanto na parte visual. E eu percebi que faria sentido trazer esse nome de novo pra colocar como banda / coletiva de apoio que participaria dos shows, das produções, tanto na parte visual quanto na parte musical. E aí as peças principais do Ministério nesse disco foram… o Lucca Noacco, na produção comigo, da parte musical e o Artur Souza na direção artística e visual do disco e ainda também tem a banda que toca comigo nos shows e o Davi de Melo Santos que fez o desenho da capa do disco. A ideia do Ministério é ser mais um coletivo rotativo de pessoas, não necessariamente ser sempre a mesma formação, mas de ser uma forma de eu conseguir trazer todos os amigos e as pessoas que trabalham ou já trabalharam comigo artisticamente de uma forma sem muito apego a fórmula banda e algo tão concreto assim, mas que seja mais uma coisa colaborativa e que no final sempre passe pelo meu filtro.
5. O título “Mirantes Emocionais” sugere uma reflexão sobre emoções e sentimentos. Como você traduziu essa ideia para a música e as letras do álbum?
O título do disco veio muito dessa ideia de que quando você vai num mirante em uma cidade, você vê toda a cidade, vê todos os bairros, as pessoas passando de carro, as luzes vibrando, a cidade acontecendo, mas você necessariamente não faz parte da cidade nesse momento, você é só um observador. E a ideia de mirante emocional vem disso, de você conseguir observar as suas emoções de longe, qualquer que seja a emoção, tristeza, felicidade, raiva… e não deixar essas emoções te influenciarem, você não é elas, você é apenas um observador das suas próprias emoções. Acho que esse foi um tema muito constante em todas as letras no disco. E por isso acabou que maior parte do disco os temas giram em torno de conexão/desconexão, que é algo que, principalmente durante o período pandêmico, que foi quando eu escrevi, e o pós também, é algo que estava muito na nossa pele ainda, no nosso dia a dia, de sentir aonde a gente se sentia pertencente ou não, aonde a gente sentia uma conexão ou não, e esse acabou virando tema do disco.
6. Sobre a capa do álbum, você mencionou uma mudança estética em relação aos seus trabalhos anteriores. Como essa mudança reflete a evolução da sua arte?
Esse foi o primeiro disco que não fiz a capa do álbum, chamei meu primo DMS, artista visual aqui de Belo Horizonte. Pois achei que ele conseguiria transcrever essa ideia do Mirante Emocional em forma de desenho e também sempre conversamos sobre trabalhar juntos, ele sempre falou da vontade de fazer a capa de um trabalho meu, então esse foi o momento certo. Foi natural, ainda mais com essa ideia do Ministério da Consciência de chamar mais um colaborador pra realizar a capa ao invés de eu fazer a capa também, foi um avanço natural e que fez sentido para esse disco.
7. Entre todas as faixas de “Mirantes Emocionais”, há alguma em particular que você considera representativa do novo caminho que sua carreira está seguindo?
Acho que Zói Fundo pode ser uma que representa bem todas essas direções novas que com esse disco comecei a seguir, pois ela mistura vários gêneros como samba, rock, punk e também atinge um pouco esse lugar da colagem musical que é uma coisa que quero muito continuar fazendo.
8. Como foi trabalhar com artistas renomados como Davi de Melo Santos na arte da capa e Kassin na mixagem do álbum?
O Davi é meu primo e já havia um tempo que conversávamos sobre ele fazer a capa de um trabalho meu e com essa ideia do Ministério da Consciência de colaborar com pessoas diferentes e todos os campos que envolvem arte fez total sentido em chamar ele pra realizar a capa desse disco e que Davi traduziu perfeitamente em forma de imagem. Já o Kassin nos conhecemos através de um amigo em comum que mostrou as primeiras versões das músicas do disco e ele curtiu e animou participar e juntos chegamos na ideia dele mixar o disco, o que foi extremamente certeiro pois trabalhando só na mix ele teve tempo e calma para pegar nuance e fazer mudanças que eu e Lucca nunca conseguiríamos por conta do ouvido viciado em ouvir as músicas quase todos os dias durante um ano, foi interessante ter isso das músicas passando por vários filtros antes de chegar no resultado final
9. Você mencionou que “Álvaro Almeida” foi o primeiro single do álbum e trouxe uma influência mais indie pop e anos 80. Como você vê essa faixa representando a direção musical do disco como um todo?
Acho que essa faixa foi a que percebi que estava fazendo algo diferente do que havia feito antes e que ela tinha todos os elementos de música pop anos 80, um refrão chiclete, liderada pos synths e um baixo mais cheio, bateria extremamente pulsante, Álvaro Almeida foi o carro chefe no que o disco representaria de estética, letra e composições.
10. Como você descreveria a mensagem ou o sentimento que espera transmitir aos ouvintes com “Mirantes Emocionais”?
Acho que pra mim a missão é sempre de criar algo que seja artisticamente inspirador e tocar o coração das pessoas e fazer elas sentirem algo, qualquer que for o sentimento já é válido. E que tenha elementos, a empolgação e a energia da música independente / underground mas que também seja forte o suficiente para chegar a todos os públicos e que todos possam gostar no seu próprio tempo.
11. Se “Mirantes Emocionais” fosse uma comida, qual seria?
Acho que algo agridoce, acho que Frango agridoce, com pimentões coloridos, molho de tomate e abacaxi em calda, suco de laranja e vinagre, talvez jogar um pouco de molho tare em cima.
12. Se o álbum fosse um animal de estimação, que tipo de animal seria?
Acho que um Jabuti, em primeiro momento parece só um animal lento e sem muitas nuances mas a partir do momento que você passar a acompanhar tudo o que ele faz e observa atenciosamente passa a perceber que mais complexo e intrigante do muitos animais grande do nosso planeta.
13. Se você pudesse assistir a um show de “Mirantes Emocionais” em qualquer lugar do mundo, onde seria?
Muitos hahahah mas acho que um show na grande muralha da China ao por do sol outonal seria especial.
14. Algumas pessoas argumentam que a música pop está perdendo sua autenticidade. Como você responde a essas críticas ao lançar um álbum mais pop como “Mirantes Emocionais”?
Acho que os artistas pop mainstream que estão sem autenticidade nenhuma e a “indústria” da mais atenção onde tem dinheiro e não onde existe música pop boa, inovadora e criativa sendo feita.
15. Com a crescente popularidade da música eletrônica, você acha que isso pode ofuscar outros gêneros musicais mais tradicionais como a MPB?
Creio que ofuscar não, mas acrescentar, é precisa pensar na música como uma ciência e que sempre vão aparecer coisas novas e formas novas de fazer música, vejo artistas como Luiza Lian no Brasil que fazem isso, pegam temas e gêneros brasileiros e misturando isso com ferramentas modernas ela cria algo novo, e isso é música, olha pra frente. A nostalgia é sempre bonita e bem vinda, mas até um certo limite.
16. “Mirantes Emocionais” tem sido aclamado pela crítica, mas houve alguma crítica que o surpreendeu ou que você considerou injusta?
Acho que nenhuma crítica é injusta, uma vez com o disco do mundo ele é das pessoas para pensarem e falarem o que quiser sobre o disco, A que mais me surpreendeu foi a da Back Seat Mafia, foi a que mais sintetizou em melhores palavras o que o disco representa, ela aqui: https://www.backseatmafia.com/album-review-arthur-melo-mirantes-emocionais-a-dazzling-alt-pop-escapade-from-the-brazilian-guitarist-and-composer/
17. Como você vê a sua evolução como artista desde o lançamento do seu primeiro EP até agora, com o lançamento de “Mirantes Emocionais”?
Acho que foi uma evolução natural e muito fruto da minha curiosidade de experimentar novas formas de compor e novos gêneros para usar de plataforma para as letras, que nesse novo disco sinto que foram as melhores que fiz até agora, muito por um tempo que tirei para pensar e escrever as letras, o que não havia feitos nos meus trabalhos anteriores. Cada vez mais pretendo abrir esse leque de absorção de novas referências e estar sempre experimentando com as novas formas de ver, ouvir e executar música.
18. Você mencionou um hiato de três anos antes de lançar novas músicas em 2023. O que motivou esse hiato e como isso influenciou sua abordagem para criar “Mirantes Emocionais”?
Em 2020 eu havia lançado meu último disco, Adeus, e a pandemia veio junto dele, com tudo isso aproveitei para trabalhar em outras coisas, participei de trilhas sonoras e mais outras coisas. Mas não deixei de continuar compondo e exercitando minha criatividade. Depois de lançar discos por 4 anos seguidos foi importante ter esse tempo sem trabalhar no modo divulgação para ver qual caminho queria seguir artisticamente e nesse tempo de 3 anos o Mirantes Emocionais foi se criando e tomando forma, foi por da tempo e usar essa calma para o disco nascer no seu tempo e desenvolver para uma usar novo artisticamente que eu não havia explorando antes
19. Como você vê o papel da sua banda, O Ministério da Consciência, na sua jornada musical e na criação deste álbum em particular?
A ideia da banda completa só entrou quando o disco já estavas pronto e começamos a pensar nos shows. Mas como coletivo desde o início O Ministério da Consciência foi ativo na criação desse album, comigo e com Lucca trocando referências e ele produzindo o album junto comigo, com todas as participações de amigos ao longo das faixas, foi o momento em que era mais um coletivo rotativo comigo e com Lucca no centro. E com o disco pronto montamos a banda para ser o formato fixo nos shows.