Entrevista: Bruna Thimoteo, cantora e compositora

- Roda da Vida é seu primeiro álbum de estúdio e reflete ciclos, encontros e introspecção. Como você definiria a essência desse trabalho?
R.: A essência do Roda é o amor, na sua forma genuína, a busca por enxergar amor nas coisas e nas pessoas, a minha busca incessante por viver uma vida com sentido, com respeito a vida. Eu entendo amor como a essência de tudo, além do romântico, o amor é a energia mais transformadora que existe e aprender a amar a vida mesmo na roda que gira o tempo todo, saber girar junto, pra mim só funciona a partir do amor.
- O disco mistura MPB, ijexá, baião e samba-reggae. Como você escolheu os ritmos que dariam forma a cada faixa?
R.: Foi acontecendo, minhas referências estão nesse lugar, são ritmos que eu escuto muito e que amo muito, então foi algo natural e orgânico de estar presente no disco. O fato do Renan estar na produção também contribuiu pra essa mistura, a produção dele tem essa tendência de misturar os ritmos, é uma brincadeira séria que a gente gosta de fazer.
- A faixa de abertura, “Maria”, homenageia a primeira alquimista. Por que essa figura foi importante para iniciar o álbum?
R.: Eu adoro saber sobre curiosidades do mundo, é um hobbie, e em uma das minhas pesquisas descobri que a primeira alquimista foi Maria, a Judia, e isso me inspirou muito, a reconhecer o poder alquímico dentro de mim, mais tarde eu tive conhecimento do Tarot através do arcano “A Sacerdotisa” e a alquimia foi ainda mais ligada dentro de mim, reconhecer a força da magia que transforma sentimentos, pensamentos, ações a partir da consciência e de saberes ancestrais.
E como ela anuncia uma entrada, achamos que encaixaria bem como primeira faixa.
- Muitas músicas trazem reflexões sobre ancestralidade e saberes indígenas, como em “Brasil”. Qual a importância de abordar essas temáticas hoje?
R.: “O futuro é ancestral” levo essa frase com muito amor no meu coração, quem disse ela foi Ailton Krenak. Sou uma brasileira altamente miscigenada, saber sobre minha ancestralidade é como juntar um mosaico de muitas peças, e reconhecer minha ancestralidade indígena é honrar uma identidade que em muito tempo me foi sucumbida. Eu me reconheço em identidade a partir do meu avô materno, entender de onde veio meu fenótipo, é uma forma de sobreviver com identidade frente a tantas questões discriminativas que já vivenciei durante a vida.
E fora isso eu realmente acredito que a sabedoria indígena pode salvar o mundo.
- A música “Bem Te Vi” é uma homenagem às avós. Como suas memórias afetivas influenciaram a construção do álbum?
R.: O Roda da Vida é recheado de memórias afetivas, nessa música em específico o Renan conseguiu criar no arranjo a sensação que tive ao olhar pra minha avó Francisca no quarto dela ao amanhecer em um momento muito delicado de saúde, eu já agradeci o Renan pela produção da música várias vezes, sempre que escuto me emociono.
Eu tenho uma relação de muito respeito com os mais velhos, fui ensinada a ser assim, minhas avós (Lurdes e Chica) tem papel fundamental na minha criação e em quem eu sou hoje, por terem personalidades fortes e subversivas, elas me ensinaram a amar a vida com respeito e dignidade.
A música tem o nome de Bem te vi porque quando eu era criança e chegava da escola a vó Chica me levava pra janela do quarto dela e dizia “vamos conversar com os bem te vi” e em seguida imitava o canto do pássaro e ele respondia com um “bem te vi” e ela me dizia “viu ele ta conversando com você” essa é uma das memórias mais bonitas que eu tenho da infância.
- O álbum apresenta também faixas mais leves e lúdicas, como “Fruta do Conde”. Como você equilibra leveza e profundidade em Roda da Vida?
R.: Eu adoro Fruta do Conde, no show ela é muito divertida de tocar. Eu acho que a vida pede equilíbrio, e como to falando da roda da vida, nem tudo é problema ou drama ou romance, também precisamos aprender a brincar nessa roda.
- O disco foi produzido por Renan Otah. Como foi a parceria na produção e na direção musical do projeto?
R.: Renan é meu esposo, então produzir com ele é sempre algo muito fácil de se conectar, nossa vida é musicada, nos entendemos fácil, e assim como nosso relacionamento, produzir o disco foi muito bom e leve. Ele é um profissional muito responsável e dedicado, ele escuta os artistas com quem trabalha e isso é importante demais. Me senti ouvida em todo o processo e ele conseguiu traduzir muito bem o que eu sentia nas produções.
- “Roda da Vida” mistura introspecção e celebração. Como você espera que o público se conecte com essa experiência?
R.: O bom disso é que tem música pra todas as ocasiões haha se você ta apaixonada pode se conectar com Tempo pra gente, se precisar de um axé pode escutar Rua do Amor e O mundo é seu, se precisar dar uma extravasada tem Roda da Vida e assim vai, o disco ta bem dinâmico, assim como a roda da nossa vida.
- O álbum será lançado com show gratuito no Teatro do Paiol. O que o público pode esperar dessa apresentação ao vivo?
R.: O show é celebração, não só desse momento de lançamento, mas da nossa própria existência, é um momento pra gente mergulhar no nosso coração, se emocionar com nossas próprias histórias, dançar pra deixar o corpo ser livre.
- Você já trabalha com audiovisual. De que maneira essa experiência influencia sua música e performances ao vivo?
R.: O audiovisual vem muito na hora de pensar a imagem dos trabalhos, iluminação do show, os videoclipes, os visualizadores, a música surge e surge com ela uma fotografia na minha mente. Sempre há uma preocupação com a direção de fotografia de todo o meu trabalho, seja nas redes sociais, quanto nos shows, tenho um cuidado com cenário de forma natural. Eu quero poder trazer mais essa visão em obras audiovisuais daqui pra frente, contar histórias através da imagem em relação com a música.
- Ao longo de sua trajetória, você dialoga com tradições afro-brasileiras e nova MPB. Qual é a mensagem que deseja transmitir através dessa síntese cultural?
R.: É natural, sou brasileira e miscigenada, isso ta dentro de mim, eu só permito que saia através das minhas canções e da minha voz.
- Por fim, quais são seus próximos projetos e objetivos após o lançamento de Roda da Vida?
R.: O projeto agora é circular com o show pelo Brasil, procurar tocar em festivais onde eu possa disseminar minha música e levar ela pro público, quero estar perto das pessoas, foram 2 anos mais introspectivos na produção do disco, agora preciso ampliar essa voz para as ruas também.
Também faremos as produções audiovisuais de algumas músicas do álbum, com tradução em libras.
Estou aberta a colaborações e feats também, acho que ano que vem vai ser um ótimo ano pra isso.