A  história da música no videogame e a sua importância até os dias de hoje

Por Fabricio Modesto, compositor, produtor musical e engenheiro de som, especialista em áudio para games

Se jogarmos as palavras-chave “o poder da música” na pesquisa do Google, centenas de conteúdos irão surgir relacionando o impacto do som e das melodias com as nossas emoções e comportamento. Porém, isso não é uma novidade. Considerando os primeiros jogos da história que passaram a emitir sons, como o caso dos primeiros caça-níqueis, em 1907, que emitiam um sino com uma combinação de vitórias – um conceito ainda presente na maioria deles hoje – já era tido como uma peça chave da experiência em Las Vegas. O barulho das máquinas-fruta, o tinir dos dólares de prata, níqueis, existiam para  criar o sentimento de sucesso. Os efeitos sonoros eram usados para vitórias e também para quando o jogador estava muito próximo de vencer, para criar a ilusão de objetivo alcançado. De fato, a eficácia do som em atrair jogadores e mantê-los interessados não foi esquecida pelas companhias quando elas mais tarde se aventuraram no mercado do videogame.

A fama dos videogames se expandiu em 1931 e dois anos depois as máquinas de Pinball foram incorporando muitos sinos e campainhas usados para atrair jogadores e criar excitação.

Tipicamente os jogos possuíam somente uma música tema para a parte introdutória e outra para a parte do final, ficando limitado apenas a efeitos sonoros no jogo em si. A música era tocada apenas quando não havia ação, já que qualquer ação requisitava toda memória disponível do sistema.

Música adaptativa era prenunciada como uma das funções proeminentes no videogame do futuro, em termos de sons não-diegéticos, Space Invaders (Midway, 1978) definiu um importante precedente para a música adaptativa, com um loop descendente de quatro tons que imitavam alienígenas marchando e que aumentava a velocidade conforme o jogo procedia. Música era algo de difícil construção e implementação nos videogames antigos devido ao longo tempo necessário para programá-las.

Apesar de alguns videogames feitos para o uso doméstico já existirem, foi só depois do sucesso dos fliperamas e da queda dos preços dos microprocessadores que essas versões foram fabricadas em massa. O console que revolucionou o mercado foi o Atari VCS (mais tarde conhecido como 2600), confiando num sistema de cartucho, tornou-se o console que mais se estabilizou sendo vendido de 1977 até 1992. Em sua edição de 1982, o 5200, usava um chip chamado Pokey que utilizava quatro canais separados que controlavam a altura, intensidade e distorção de cada, possibilitando uma música com 4 canais ou “vozes” a ser reproduzida pela primeira vez. Daí em diante todo console novo tinha uma inovação. O Nintendo Entertainment Systems (NES) utilizava 5 canais de sons monofônicos, a entrada da Sega no mercado, em 1986, trouxe o sistema de 3 geradores de sons com quatro oitavas em cada. Em 1989, a NEC Turbo Grafx trouxeram um sistema de 6 vozes com saída estéreo e o Sega Genesis com 10, ambos mais tarde com um acessório que permitia a qualidade de CD. 

Os processadores de áudio continuaram a evoluir, adaptando chips de sintetizadores, processadores de 16-bits, mais vozes, mais memória e até processadores de efeitos internos.

Longe dos consoles e plataformas de jogos dedicados, o PC estava começando a mostrar seu potencial, inicialmente, com sons precários devido a memória que era sempre um problema e o som era sempre deixado de lado. 

Em resposta a situação, as placas de som começaram a ser projetadas com um pequeno chip de sintetizador que permitiam pequenas mensagens que diziam para o dispositivo tocar e quando tocar. O banco de sons tinha 128 sons com a capacidade de 16 notas a serem tocadas ao mesmo tempo. O uso do MIDI (Musical Instrument Digital Interface) foi se tornando mais e mais comum e mesmo com o som desagradável das placas antigas de som, era possível a criação de músicas mais complexas, e com o tempo os programadores foram dando lugar aos compositores numa progressão considerável.

Os formatos de áudio como os .wav e .aiff de hoje em dia, inicialmente, era por meio de algoritmo de compressão que os possibilitava serem tocados em .voc nos videogames, fazendo com  que o áudio não se limitasse mais as paletas de som do hardware do game, podendo ser gravada e reproduzida como qualquer outra música, a qualidade no início era semelhante a de radio AM, mesmo assim abriu portas para os músicos e designers de som explodirem suas criatividades.     

Hoje em dia, com o avanço da tecnologia, as possibilidades aumentaram com a chegada das mídias Blu-Ray e o aumento na capacidade geral de armazenamento de dados nos consoles e assim, conseqüentemente, possibilitando que jogos explorem toda a capacidade sonora sem a preocupação com tamanho de dados, possibilitando até mesmo se deleitar ao som de belíssimas composições tocadas por grandes orquestras no mais alto patamar dos quesitos de qualidade áudio.

Atualmente, o negócio global do videogame representa uma enorme indústria cultural. As estatísticas desde o surgimento da indústria não param de crescer e as vendas são massivas. O mercado da música hoje em dia está muito mais democrático devido à qualidade elevada de uma gravação feita em casa e a distribuição massiva pela Internet. Entretanto para os desenvolvedores de jogos independentes a vida não é tão fácil. Não há como competir com o investimento de peso que as produtoras fazem em jogos para plataformas como o Playstation 5 e o X-Box Series X, pois além de terem equipes enormes que cuidam de cada setor do jogo em especifico há a verba destinada ao marketing, que conta ainda com diversos acordos com gravadoras para divulgar o trabalho de um artista incluindo sua música no jogo.

A venda de jogos já foi significativamente maior do que a dos CD’s e outras mídias de entretenimento. Frente a isso, alguns departamentos de Marketing viram como estratégia a contratação de estrelas de Hollywood para fazer as vozes de determinados personagens, usando a fama do artista para promover o jogo.

Diante do sucesso do nicho de mercado e demandas da indústria, muitos designers de som e talentos da voz do cinema passaram a atuar também na área de games. E, embora, muitos dos conceitos temáticos dos primeiros videogames foram vistos antes pelos seus antepassados mecânicos como os Pinballs, a música nos jogos hoje, ainda que estejam cada vez mais sofisticada e profissional, segue com a mesma função dos caça-níqueis de 1907, de aumentar a imersão do jogador, criando uma maior conexão entre ele e o universo proposto no game, tendo a música como componente integrado do jogo em conjunto com outros elementos como arte gráfica e jogabilidade.