Entrevista: Mariana de Azambuja Cardoso, advogada
“Coisas Que Me Lembram Você” marca sua estreia na literatura. Como foi o processo de transição da advocacia e do roteiro para a escrita de um romance?
Acho que não houve exatamente uma transição… Apenas acumulei funções! Ao mesmo tempo em que minuto um contrato, negocio um acordo e faço inventários extrajudiciais, curso mentorias de cinema, escrevo roteiros novos e esboço a continuação de Coisas Que Me Lembram Você – que, vale dizer, já está com o primeiro tratamento do piloto pronto, caso surja a oportunidade de adaptação do livro para as telas.
O Direito é, e sempre será, a minha base. Contar histórias, meu sonho. Os roteiros, por acaso, chegaram primeiro. A literatura veio em seguida. Ainda que, em algum momento, eu precise escolher um único caminho, por dentro, jamais deixarei de ser advogada, roteirista ou escritora.
O livro traz uma protagonista adolescente e mergulha nas emoções e descobertas da juventude. O que a motivou a escrever sobre essa fase da vida?
Adoro escrever para adolescentes e jovens adultos! Além de ter muitas inspirações pessoais dessa fase da vida, ainda tenho duas filhas, uma de 24 e outra de 16 anos, que enriquecem meu acervo com novos casos e histórias, me atualizando constantemente sobre os temas e interesses dessa faixa etária.
Fora isso, meu debut na dramaturgia foi com CRUSH!, websérie para adolescentes que, além de alcançar mais de 500 mil visualizações no YouTube, ainda concorreu aos prêmios de Melhor Série Brasileira e Melhor Série Infantojuvenil no Rio WebFest 2020, além de ter ficado entre os finalistas na categoria de Melhor Websérie, no Prêmio Jovem Brasileiro 2021.
Você acredita que a literatura voltada ao público teen e jovem adulto ainda é subestimada no Brasil?
Esse nicho tem sido um fenômeno mundial e o Brasil não fica de fora. Basta ver o sucesso que as adaptações literárias, voltadas para essa faixa etária, fazem por aqui. Porém, embora existam nomes brasileiros de peso, como o de Thalita Rebouças, no geral há um maior consumo (e oferta) de autores estrangeiros que escrevem para o público teen e jovem adulto.
A história nasceu como um projeto audiovisual. De que forma essa origem influenciou a estrutura narrativa do livro?
Coisas Que Me Lembram Você nasceu como uma sinopse de um web piloto, que ficou entre os finalistas no Rio WebFest 2020. Depois disso, virou roteiro de uma dramédia voltada para o público jovem adulto e adulto, que narrava a saga de Fernanda e Bel, mãe e filha, ao melhor estilo Gilmore Girls. No entanto, encantada com o sucesso de CRUSH!, websérie teen que marcou minha estreia na dramaturgia, resolvi me manter fiel ao público adolescente e contar a mesma história, porém levando em conta apenas o ponto de vista e o olhar de Bel, uma jovem de 17 anos. Além disso, resolvi me aventurar na literatura, onde a trama ganhou uma narrativa mais leve e ganhou ares de comédia romântica, embora tenha mantido traços dramáticos.
A playlist que acompanha os capítulos é um diferencial criativo. Como foi o processo de seleção das músicas e qual papel elas desempenham na leitura?
Escolhi as canções como se estivesse escrevendo um roteiro de musical. Ou seja, busquei composições que, através de suas letras ou das emoções que transmitem, ajudassem a contar aquela determinada parte da trama. Eu amo o poder que a música tem de potencializar sentimentos e ativar memórias. Assim, acredito que a leitura, com uma trilha sonora de fundo, tornará a experiência mais envolvente e inesquecível.
A jornalista Mariana Gross escreve a orelha do livro. Como é ter o olhar de uma amiga e comunicadora experiente endossando sua estreia literária?
É maravilhoso! Só uma grande amiga, que viveu tanta coisa ao meu lado – lá se vão quase 40 anos de amizade –, poderia ter escrito algo tão sensível e perfeito. Fiquei absurdamente emocionada ao ler a orelha. Sem entrar em um detalhe sequer da minha vida, a Mari fala de mim e deixa claro o quanto me conhece. Ela conseguiu captar a essência do que escrevi e todos os sentimentos presentes em cada trecho da história, como se tivesse lido o livro com os meus olhos.
O romance aborda temas como perdas, preconceitos e recomeços. Há elementos autobiográficos ou experiências pessoais que inspiraram a obra?
Sim. Costumo dizer que Coisas Que Me Lembram Você é uma obra de ficção, com pitadas de realidade. Misturei inspirações de situações que vi e vivi com contextos completamente alheios à realidade. Porém, embora não tenha me atido a fatos e cronologias, todos os sentimentos vivenciados em determinados acontecimentos que trago na história são completamente fiéis ao que realmente experimentei na minha adolescência.
Seu trabalho anterior, o musical “CRUSH!”, fez muito sucesso entre o público jovem. Que aprendizados dessa experiência você levou para o livro?
Ouvir o público-alvo, o que eles têm a dizer sobre o texto, é fundamental. Em CRUSH! foi assim. A cada leitura do roteiro com jovens e com o próprio elenco da websérie, anotava todas os comentários que faziam – e, com isso, aproximei a obra da realidade dessa faixa etária. Enquanto escrevia o livro, ao final de cada capítulo, pedia para minha filha caçula, que é uma leitora voraz, me dar a opinião dela. Me vali também do feedback de alguns amigos e amigas da mesma idade, que leram trechos da trama. Levei todas as sugestões e ponderações em consideração. Além disso, ao tratar de temas mais sensíveis, tanto em CRUSH!, quanto em Coisas Que Me Lembram Você, pedi o aconselhamento da minha grande amiga Lulu Joppert, que é uma renomada psicóloga, com vasta experiência em adolescentes.
O livro fala sobre amadurecimento, amizade e amor. Que mensagem principal você gostaria que o leitor carregasse após o fim da leitura?
A primeira delas é o maior legado que Sociedade dos Poetas Mortos me deixou: Carpe Diem! Aproveite o dia, valorize o agora, pois nada é eterno, as coisas mudam quando menos se espera e o tempo não volta. Por outro lado, procuro mostrar que não importa o tamanho do baque, por maior e mais difícil que seja, é preciso (e possível) reagir, lidar com as dores e feridas e, respeitado o tempo de cada um, contando com o carinho e o apoio de quem amamos, recomeçar. Tudo isso falando de temas importantes e sensíveis, em meio a assuntos mais leves e suaves, comuns aos adolescentes e jovens adultos.
Como tem sido o diálogo com os leitores adolescentes e jovens adultos desde o lançamento? Algum retorno ou reação te emocionou especialmente?
Aguardando ansiosa o lançamento, justamente para ver como o livro será recebido pelos adolescentes e jovens adultos. Espero que a história cative os leitores, que os personagens caiam no gosto do público teen, assim como aconteceu em CRUSH!. Dedos cruzados!
Em um cenário literário tão plural, como você enxerga o papel da mulher autora escrevendo sobre juventude e afetos no Brasil contemporâneo?
Publicar um livro para jovens é um meio poderoso de falar com essa faixa etária. Querendo, ou não, você aconselha, mostra pontos de vistas e perspectivas sobre determinados assuntos, traz ao debate tópicos necessários e importantes. Assim, como autora e, principalmente, como mãe, entendo que escrever para adolescentes e jovens adultos requer sensibilidade, cuidado e muita responsabilidade.
E olhando para o futuro — você já tem novos projetos literários ou audiovisuais em andamento? Pode adiantar algo?
Além de já estar com o primeiro tratamento do piloto de Coisas Que Me Lembram Você pronto, torcendo para que, eventualmente, venha uma adaptação do livro para o audiovisual, já tenho arcos dramáticos bem desenhados para mais dois volumes da obra. Além disso, seguirei na luta para realizar You Are The One, espetáculo de teatro musical, que conta uma história de amor através da banda norueguesa a-ha – de quem sou fã desde a pré-adolescência.
