Entrevista: Banda Lobo Temporal

- O título do álbum, Viva O Que É Real, parece ser mais do que um nome — é quase um manifesto. Como essa ideia surgiu e por que ela se tornou o eixo central do disco?
Barsa: O título tem na verdade duplo-sentido, pois a palavra “Viva” pode ser interpretada como interjeição para expressar entusiasmo pelos momentos reais e também como verbo para incentivar a quem estiver imerso de forma não equilibrada no mundo virtual a ajustar essa dose. Essa intenção da mensagem somada à leitura do momento, com tantas pessoas adoecendo deprimidas pelo mau uso das redes sociais, fez surgir a ideia de darmos a essa música a função de eixo central para destacar a importância dessa mensagem.
Luiz: Todos nós demais da banda concordamos com o Barsa e acreditamos que a música “Viva o que é real” traduz nosso som, nossas letras e tudo que acreditamos como banda.
- Em um mundo dominado por filtros e aparências digitais, como vocês enxergam o papel do rock e da arte na busca por autenticidade?
Luiz: Acredito que a música e a arte em geral têm o papel de romper máscaras e expor verdades. São formas de expressão cruas e sinceras, que conectam as pessoas pelo que elas realmente são, não pelo que aparentam ser.
Gabriel: O rock sempre foi caracterizado por ser um estilo que quebra os padrões e oferece autenticidade. O rock sempre ofereceu uma alternativa no modo de ser, de enxergar e pensar. E nós da LT não somos diferentes. No mundo digital as pessoas querem parecer e não ser, então mesmo o óbvio precisa ser dito às vezes, pois, poucos tem coragem de falar algo diferente e acreditamos no nosso papel de mostrar e falar sobre isso.
Barsa: Eu tenho uma linha de pensamento que preza muito pela liberdade, algo que aprendi pela linha filosófica do existencialismo, por tal, não acho que o artista ou o rock tem a missão de salvar o mundo, creio que cada um constroe e carrega a sua verdade e deve ser livre para fazê-la. Ou seja, se algum artista quer fazer um rock com uma intenção contrária, por mim ok. O que me faz compor canções como a Viva o que é real que provoca a questão da autenticidade está acima da arte e do rock, está ligado aos valores e visão de mundo que carrego, que naturalmente nem todos vão concordar.
- A faixa-título traz versos potentes como “Ditadores binários não vão nos domar”. Qual foi o processo de composição dessa música e que mensagens vocês queriam cravar ali?
Barsa: Eu compus essa música em 02/2022, no meio da pandemia em que estávamos impedidos de fazer shows e nossa única maneira de comunicar com o público era virtualmente, e deparamos com o paradoxo de dependermos das mídias sociais sem querer virar escravos dela. Foi um período que ficar forçadamente em casa me provocou muitas reflexões e como resultado muitas composições. Eu diria que a palavra única para definir a mensagem dela seria “equilibrio”. A reflexão que ela traz a tona não busca incentivar voltar a idade da pedra, é simplesmente que cada ouvinte a partir desse alerta, reflita se perdeu esse equilíbrio e busque, se desejar, encontrar seu equilíbrio ideal.
- O álbum é descrito como uma “estreia corajosa e madura”. Como foi o processo de construir essa identidade tão sólida já no primeiro trabalho?
Luiz: Foi um processo intenso de muito aprendizado e entrega.
Barsa: Foi um caminho de autodescoberta, as músicas do EP foram mudando ao longo do processo, Gravidade, Suspecting e Viva o que é real sempre estiveram na lista, mas as demais foram uma loucura para serem escolhidas, queríamos muito que esse primeiro EP fosse uma amostra inicial de tudo que virá, músicas não só sobre questões sociais, mas também de autodescoberta e sobre o amor. Não carregamos a obrigação de sermos rock de protesto e etc, somos livres para falar de tudo, de uma reflexão profunda a uma balada romântica.
- O disco mescla rock alternativo, hardcore melódico e elementos de nu metal. Quais foram as principais influências musicais que moldaram esse som?
Luiz: Cada membro da banda tem suas referências pessoais, nos meus riffs de guitarra procurei mesclar referências como guitarrista Tony Iommi, principalmente em riffs mais pesados. Usamos também referências de bandas nacionais como CPM22, Detonautas. Charlie Brown Jr e O Rappa.
Gabriel: Na bateria coloco influências de Bandas e artistas como SOAD, Red Hot, Linkin
Park, Audioslave, Pearl Jam e Coldplay.
- A estrutura das músicas parece bem pensada, com variações intensas de dinâmica. Vocês poderiam falar mais sobre o cuidado com os arranjos e os momentos de impacto no álbum?
Gabriel: Assim como as bandas que nos inspiram, somos 5 pessoas com ideias diferentes que de modo utópico, conseguimos fazer um trabalho que apresente um consenso de ideias entre os 5. Às mudanças de dinâmica nos arranjos são características dessas ideias, onde em todas as músicas existem a assinatura e autenticidade de cada um dos 5.
- Como vocês equilibram peso e melodia sem perder a força emocional das músicas?
Barsa: Eu sempre componho no modo Voz e Violão, o que ajuda a dar um tom intimista e emocional nas músicas no nascimento. Quando entra a banda, principalmente tendo duas guitarras, vem um peso de encontro que provoca esse resultado final.
Luiz: A gente busca esse equilíbrio naturalmente, deixando a emoção guiar cada escolha. O peso vem da intensidade, e a melodia ajuda a carregar a mensagem — os dois caminham juntos pra manter a força e a verdade em cada música.
Gabriel: Essa é uma das assinaturas da banda, essa junção faz das nossas músicas algo que transmite ao ouvinte de modo mais preciso a mensagem que queremos transmitir.
- A formação da banda reúne músicos com diferentes experiências. Como essas bagagens individuais se encontram no som da Lobo Temporal?
Luiz: Cada integrante trouxe influências únicas, e isso enriqueceu nosso som. A mistura dessas vivências cria uma identidade própria, onde as diferenças se somam e viram a essência da Lobo Temporal.
Barsa: Eu gosto muito que todos sempre me surpreendem quando trazem suas ideias e arranjos, essas diferenças ampliam muito nossa capacidade sonora de criar músicas únicas mantendo a cara de Lobo Temporal.
- O nome “Lobo Temporal” tem uma força simbólica. O que ele representa para vocês artisticamente e pessoalmente?
Barsa: Quando criei esse nome, nunca poderia imaginar que um dia a banda teria trabalho autoral, a visão na época era ser cover anos 90/2000, e o nome fazia referência tanto à parte do cérebro que fica ativa nos momentos de emoção musical quanto às características de lealdade e união do animal Lobo, e temporal pela nossa finitude. Quando a trajetória autoral surgiu e pessoas começaram a acompanhar e apoiar nosso legado, como o fã clube Lobetes, a parte da união como Lobos ficou muito forte e hoje todos os envolvidos se sentem como Lobos Temporais, somos uma família, uma “alcateia de energia positiva”, como digo na música Viva o que é Real.
Luiz: “Lobo Temporal” representa instinto e transformação. É sobre enfrentar o caos com coragem e seguir em frente com intensidade — tanto na arte quanto na vida.
Gabriel: Lobo Temporal significa pra mim renovação, inovação, uma visão diferente sem se desconectar da realidade
- Qual foi o maior desafio de gravar esse primeiro álbum? E qual foi o momento mais marcante durante o processo?
Barsa: Para mim o maior desafio foi ter forças para voltar após a perda do meu amigo e nosso produtor Gustavo Procópio, que faleceu pela Covid-19 em 05/2021, durante a produção da Gravidade. Essa perda enorme foi sem dúvida o momento mais marcante.
Luiz: Falta de experiência em gravações, todos nós tivemos muito aprendizado ao gravar cada faixa, momento mais marcante o resultado da última música “Viva o que é real”, resultado que todos da banda ficaram satisfeitos.
- Gabriel: O maior desafio foi criar e apresentar músicas e arranjos que mostrasse algo novo mas sem perder características das influências e inspirações pra cada música. Fazer isso criando algo novo e de certa forma original foi o grande desafio. O momento mais marcante foi a perda do produtor Gustavo para o COVID 19.
- O álbum já está nas plataformas e tem gerado bastante repercussão. Como tem sido a recepção do público até agora?
Luiz: Tem sido incrível! A galera se identificou com as letras e a energia do som. Ver tanta gente sentindo e vivendo o EP com a gente tem sido muito gratificante.
Barsa: Dentre vários tem 2 retornos que se destacam pra mim, primeiro muitos comentam sobre a junção música e letra, e segundo as pessoas não conseguem nos comparar a uma banda específica, demonstrando que conseguimos entregar uma identidade única.
- O selo Musikorama Music tem um papel importante nesse lançamento. Como tem sido essa parceria e o que ela representa para a trajetória da banda?
Barsa: A qualidade sonora que a música Viva o que é real entrega é resultado de um processo que fomos passando ao produzir as outras músicas com o apoio da Musikorama Music, o que não teríamos alcançado sozinhos. Além da parte sonora, toda a mentoria e direcionamento foram essenciais. A parceria nos proporcionou alcançar uma maturidade que todos poderão perceber no nosso segundo EP que logo logo iniciaremos os lançamentos.
Luiz: A parceria com a Musikorama tem sido essencial. Eles acreditaram no nosso som desde o começo e nos deram o suporte certo pra esse primeiro passo. Representa confiança, estrutura e a chance de levar nossa música mais longe.
- O que vocês esperam que as pessoas sintam ou pensem depois de ouvir o disco completo?
Luiz: A gente espera que sintam algo verdadeiro. Que as músicas toquem fundo, provoquem reflexões e inspirem as pessoas a viverem com mais coragem, intensidade e autenticidade.
Gabriel: Que sintam a vontade de fazer melhor, que pensem em como melhorar a vida ao seu redor, como influenciar positivamente pra um mundo melhor. É sobre cada ação ou atitude sua ser algo que influencie uma melhora na sua vida.
Barsa: Fiquei ouvindo o EP completo por dias até chegar no slogan “Ouça e transforme-se”. Acho que essa frase resume bem o potencial que esse EP oferece ao ouvinte, com muita energia positiva buscar transformações para melhor sempre.
- Se vocês tivessem que escolher uma frase do álbum que resume o espírito da banda, qual seria?
Luiz: “Viva o que é real” — essa frase resume tudo: a entrega, a verdade e a essência do que somos como banda.
Gabriel: ”Que minha esperança possa acreditar, que cada esforço não foi em vão.”
Barsa: Creio que Viva o que é real resume nossa missão e valores, mas nosso espírito, eu concordo com o Gabriel ao usar a Gravidade, depois dessa trajetória de quatro anos com
tantos percalços nada mais perfeito que “Que minha esperança possa acreditar, que cada esforço não foi em vão.”
- O que é “viver o que é real” para cada um de vocês hoje?
Gabriel: Viver o que é real é acreditar que a no final do processo, tudo valerá a pena, que
todo o caminho foi um aprendizado para vencer o próximo obstáculo que virá.
Luiz: Para mim, ‘viver o que é real’ é estar em sintonia com minhas emoções e escolhas, sem tentar esconder quem sou ou me adaptar a padrões. É seguir meu caminho com verdade, tanto na música quanto na vida.
Barsa: Ser dono de si, tendo a liberdade de pensar e fazer escolhas não direcionadas e colecionar incertezas, viver bem sabendo que muita coisa não tem resposta e tudo bem. Viver o que é real valorizando experiências humanas, não o que é material, viver com propósito, com amor ao que faz e ao seu caminho, não pelo dinheiro, fama , ostentação. Levar uma vida simples com o pouco que precisamos de verdade, carregando de valor não o que pode ser visto pelas pessoas, mas o que carregamos no coração e na alma.