Entrevista: A Banda Mais Bonita da Cidade

Entrevista: A Banda Mais Bonita da Cidade

1. Como foi o processo de criação deste novo álbum e o que ele representa para vocês enquanto banda?
vini: O processo de criação dos álbuns da banda comumente são complicados, com muitas idas e vindas nos arranjos e conceitos… Esse incrivelmente foi o processo mais leve e fluido até hoje. Em parte porque já sabíamos a sonoridade que queríamos, a energia que queríamos, a mensagem que queríamos. O repertório dele já estava definido há mais de um ano e fomos arranjando e produzindo durante o ano inteiro (2023). Ajudou bastante também a divisão na produção musical entre eu e o Du (Eduardo Rozeira), cada um colocando suas ideias e conciliando os caminhos a serem percorridos. É um disco bem importante para nós, é o primeiro disco com o Du na guitarra e com o Vic (Vilandez) no baixo… o álbum ficou com a cara e a sensibilidade deles bem impressa em todas as faixas e ainda assim também consigo ouvir a personalidade mais clássica da banda ressoando.

2. Podemos perceber uma forte temática de movimento e transformação nas letras do disco. Como vocês abordaram esses conceitos na composição das músicas?
Uyara: Acho que é um reflexo de como a gente tem sentido a vida mesmo. Esses temas são sincronizados espontaneamente com nossos processos pessoais.
A escolha do repertório não parte de um tema ou desse tema, é uma escolha mais intuitiva, vou separando o que me toca, o que mexe comigo de alguma maneira, depois a coisa vai desenhando, chegando num lugar comum.

3. Alguns críticos argumentam que a música contemporânea está perdendo sua profundidade lírica em prol de produções mais comerciais. Como vocês veem esse debate em relação ao trabalho de vocês?
Vic: O que é considerado uma música com profundidade lírica? Profundo para quem?
Fico reflexivo pois percebo que geralmente essas críticas se voltam a manifestações da cultura negra e periférica, como o funk, por exemplo, que é um gênero musical que está em voga em inúmeras produções comerciais.

É comum críticos associarem as letras do funk com a imoralidade, promiscuidade e como algo “não profundo”. Mas se analisarmos produções modernas como L’incoronazione di Poppea, de Monteverdi (1642) e As bodas de Fígaro (1786), de Mozart são obras que também possuem conteúdo explicitamente erótico. A “profundidade lírica”, é monopólio do príncipe ou também pode ser uma experiência compartilhada por todos?

A gente sabe que o capitalismo transformou a cultura em mercadoria e a produção cultural em uma produção industrial. Mas para além da indústria contemporânea do entretenimento, também sabemos que a música é um reflexo dinâmico da cultura e um instrumento potente para a articulação social.

Fronteiras estéticas, geográficas e temporais determinam a combinação dos diferentes elementos que constituem uma produção musical, e paralelamente a isso, é necessário entender qual é a interação trilateral – criadores, intérpretes e públicos, ou seja, em que tipo de espaço a obra será executada e quais tipos de pessoas irão ouvi-la.
Dessa forma, eu muito curiosamente me pergunto: o futuro já está acontecendo d’A Banda Mais Bonita da Cidade será ouvido por quem, onde e como?

4. Quais foram as principais influências musicais e artísticas que contribuíram para a criação deste álbum em particular?
Luis: Acho que as principais influências para as músicas são as próprias composições. Como a banda é uma banda intérprete, o trabalho autoral das compositoras e compositores sempre influenciam bastante no nosso processo de arranjo, mesmo que de modo indireto, na forma como as músicas acabam soando. Muitas versões da banda tem inclusive versões originais (como o caso de Promissões, da Kluber). Acho que as influências acabam aparecendo mais no arranjo, na forma como a gente percebe a composição. Nesse caso, acho que tem muitas fontes diferentes que direcionaram não só os arranjos do álbum, mas também a banda como um todo, além das nossas influências individuais, que acabam influenciando nossa forma de tocar e cantar. Acho que teria que fazer uma lista enorme aqui, então, diria que, diferentemente dos outros discos, em o futuro.. algumas músicas acabaram soando com mais influência da música brasileira, sempre misturando com outras coisas, de Arcade Fire a Beatles, eu acho.

5. O álbum apresenta composições de diferentes membros da banda. Como foi o processo de colaboração e como vocês mesclaram suas visões individuais para criar uma obra coesa?
Eduardo: O fato de sermos uma banda intérprete acaba traçando um norte meio fixo: nos reunimos e mostramos compositores e composições que nos interessam e achamos que faria sentido no propósito da banda. A partir daí vamos sentindo o que teria mais significado num total, e, apesar de não ser uma escolha esclarecida e racional, acho que funciona muito bem no final das contas. Eu tive a honra de ter uma das minhas composições escolhida pra fazer parte do repertório desse álbum, mas essa história é longa demais hahahaha. E sobre a parte de “mesclar nossas visões individuais”: na verdade todos nós pensamos muito parecido na maioria dos assuntos… Então não acho que aconteceu uma “busca por coesão” entre as letras (porque elas já estavam resolvidas), mas sim na sonoridade do álbum em si.

6. Vocês optaram por um som mais orgânico ou exploraram mais elementos eletrônicos neste álbum? Como foi a experimentação nesse aspecto?

vini: A banda sempre buscou uma sonoridade mais orgânica, normalmente com isso tentamos trazer essa energia de banda, de bastante gente tocando ao mesmo tempo. Mas nesse álbum nós exploramos o outro caminho; em “Calma”, por exemplo, não tem banda tocando em nenhum momento… em “Peraí” e “Talhamar” colocamos elementos que nem são instrumentos… Mesmo assim, acho que é um movimento natural experimentar sonoridades e deixar o processo fluir pra outros caminhos. Ter uma banda (ainda mais com 15 anos de estrada) exige que a gente sempre busque novidades na criação de um disco.

7. Alguns críticos sugerem que a indústria da música está se tornando cada vez mais homogênea, com pouca diversidade de estilos e abordagens. Qual é a opinião da banda sobre essa questão?
vini: Acho então que alguns críticos não têm ouvido muita música rs. Brincadeiras à parte: sim, quando se fala em “indústria da música” há realmente alguns caminhos traçados, mas ainda assim isso nem de longe torna a arte homogênea. Acho que essa é uma reclamação constante da crítica, de tempos em tempos essa discussão ressurge e no fim das contas, quando se olha pra trás se percebe que a arte está sempre em processo de renovação, reciclagem, criação etc. Se alguém acha que está tudo parecido, é porque está ouvindo de forma errada, não está se atentando aos valores certos… sempre tem algo de novo. As barreiras estão sendo quebradas constantemente e tudo o que é feito abre um novo leque de possibilidades para futuros artistas.

8. Com este novo álbum, vocês esperam alcançar novos públicos ou consolidar ainda mais sua base de fãs existente?
Uyara: Acho que os desejos coexistem, o de fortalecer a base e o de aproximar novos públicos.

9. Após o lançamento deste álbum, quais são os próximos passos para a Banda Mais Bonita da Cidade? Existem planos para turnês ou novos projetos?
Uyara: Estamos ansiosos pra fazer show no maior número de lugares possível, pessoalmente esse é o meu momento favorito, o show, o encontro, então teremos com certeza grandes circulações com o disco novo, e os desdobramentos do lançamento, como gravação de sessions, clipes, participações. Mas acho que nosso grande foco agora é circular. Encontrar o público.

10. Qual é a principal mensagem que vocês esperam transmitir aos ouvintes através das músicas deste álbum?
Uyara: Acho que de alguma maneira cada um de nós tem um entendimento diferente sobre o que é pra cada um  “o futuro já está acontecendo”  mas acho que as percepções se encontram no desejo de afirmar mais uma vez a vida, os ciclos, o auto acolhimento, a percepção do tempo, os questionamentos que a gente faz pra si mesmo,  os amores, as dores, as pequenas e grandes redenções, coisas que são ordinárias e ao mesmo tempo mágicas. Acho que mais que uma mensagem, desejamos muito que as pessoas se relacionem com as músicas, que a música possa dar algum sentido, seja num momento leve de dançar na sala com as amigas, ou num momento de atravessamentos profundos. Que a música possa estar.
Acho que se fosse escolher uma mensagem, eu citaria Caetano “I’m alive and vivo, muito vivo vivo”

marramaqueadmin

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