Entrevista: Juão Nÿn, cantor e compositor
1. Bem-vindo, Juão Nÿn. É um prazer ter você aqui. Vamos mergulhar nesse projeto incrível que é o álbum “NHE’ETIMBÓ”. Para começar, como surgiu a ideia de criar um álbum inteiro em Tupi?
Sempre quys por no mundo algo que fosse da mynha terra, de mym, já que vyvemos numa cydade tão Colonyal como Natal, Colonyal de Bastysmo. Batalhey, escavey e agora to compartylhando com os meus o que é nosso por dyreyto.
A Colonyzação é exógena: de fora pra dentro.
NHE’ETIMBÓ é endógeno : de dentro pra fora.
Autodetermynação
Memórya Étnyca
2. A fumaça como ponte entre o mundo material e imaterial é um conceito profundo e fascinante. Como você integrou essa ideia na construção das músicas do álbum?
Acho que só fyz olhar e escutar o que já faço de forma dyferente e quys trazer esse deslocamento de perspectyva para o públyco, mas não há nada de novo. Apenas conceyto. Reelaboração. É uma saudação ao recomeço. O futuro é étnyco.
3. A canção “KARAIMONHANG” é um pedido de bênção. O que essa palavra significa para você e como ela ressoa no contexto cultural indígena?
4. Você mencionou que “AWE NHE’E” resgata palavras sagradas que foram distorcidas pelo racismo religioso. Como foi o processo de reapropriação dessas palavras?
Este processo aynda não acabou, e não acabará tão cedo, por ysso, acredyto, a músyca surgyu assym: ruydosa com começo e fynays turvos. É algo que quero que ecoe em mym e nos outros numa yntelygêncya menos racyonal e mays de poro. Sou tbm eu negando o dydatysmo e deyxando de fato algo agyr.
5. Guilherme Kastrup na produção deste álbum? Como essa colaboração influenciou o resultado final?
Kastrup me falou que é um arquiteto, ele me ajudou a organyzar e a estruturar tudo. Pensar camadas, estétycas, me puxou quando quase deyxey a Peter cayr. Um artysta de horyzontes ymensos, generoso e compreensyvo.
6. A faixa “SY’I” é uma homenagem à sua mãe e avó. Como foi o processo de composição dessa canção tão pessoal?
À mynha Tya também, que é gêmea da mynha mãe. Jussara e Jurema. Duas grandyosas plantas. Eu querya falar “Maynha” em Tupi e conversando com Romildo Araújo, consultor Lynguýstyco do álbum, a gente chegou a conclusão que SY’I fycarya bonyto, já que o sufyxo “i” é de dymynutyvo. A partyr daý fuy lembrando o quanto voltar pra mynha terra e estar com mynahs Mães me conforta. Devo tudo a elas. E comecey a escrever, como um treinamento, já que vy mynha Vó cuydar da mynha bysa e hoje vejo mynha mãe cuydando da mynha Vó, tô ensayando pra cuydar da Mynha Mãe. É uma musyca pra cudyar de quem cuyda. Uma canção para nynar úteros.
7. Você mencionou a guerra entre a fumaça boa e a ruim em “XAWARA SUPÉ”. Como essa metáfora se conecta com a realidade dos artistas indígenas contemporâneos?
Dyante desta metáfora, sendo Operáryos da Cultura, somos Guerreyros da Fumaça. Quantos Artystas Yndýgenas você vê em Festyvays de Músyca? Não precysa ser Temátyca Yndýgena, falo de nosso corpo e presença. De um modo geral, desde à Publycydade, cynema, Teatro, TV, músyca…é menos de 1%. Portanto, nossas narratyvas, sýmbolos e cosmoperspectyvas não estão nestes lugares, quem ocupa ? O Agronegócyo, o consumo desenfreado, a falta de sustentabylydade, a monocultura dysfarçada até de amor romântyco, as cryses clymátycas e temátycas. A guerra é sobre terrytóryo, a treta é fýsyca e nos Ymagynáryos.
8. Você descreve o álbum como um “contrafeitiço musical”. O que isso significa para você e como espera que o público receba essa obra?
Sygnyfyca pra mym a lybertação de muyta armadylha e fantasya colonyal que o mercado da Arte prega, a construção de outras possybylydades em vyver de arte, a contrybuyção symbólyca à luta das mynhas lyderanças e do meu povo. Espero que o públyco atravesse o espelho, parem de sonhar apenas consygo mesmo ou com desejos capytalystas e aumentem o perýmetro do terrytóryo do ymagynáryo. Derrubem cercas que os lymytam em percepção e cryação. Que possamos ymagynar juntos um mundo realmente possývel para todes.
9. A canção “ABYA YALA” ecoa a expressão “Terra Viva” dos povos originários. Como essa mensagem de afirmação se conecta com a luta por reconhecimento e respeito às culturas indígenas?
Mays de 120 lyderanças, de dyversos povos, dos cerca de 500 deste contynente, anos atrás, decydyram que esta serya nossa autodetermynação. To espalhando a semente, sou mays uma ramificação dessa rede.
10. Como você vê o papel da música indígena contemporânea na indústria musical atual? Quais são os desafios e as oportunidades?
Temos um papel transformador e anuncyador de como será esse paýs no futuro. Somos antenas e rayzes de tudo que há de melhor do passado e do futuro presente. O desafyo sempre foy : que o Branque cumpra a Constytuyção de 88, Demarque nossas Terras para termos mays polýtycas publycas que nos garantam estruturas para que tenhamos dygnydade e dyreytos garantydos, para cryarmos com excelêncya. Não queremos cantar só sobre sobrevyver, também queremos o bem vyver de nossas Cryações..
11. Qual é a sua faixa favorita do álbum, ou é como escolher entre filhos?
KARAIMONHANG
Ela representa em rytmo e letra coysas que gosto de por no mundo.
12. Se você pudesse tocar “NHE’ETIMBÓ” em qualquer lugar do mundo, onde seria?
Na Festa da Castanha ou na Cesta da Batata, festas Tradycyonays Potyguaras do RN.
13. Já tentou explicar o conceito do álbum para alguém que não entende nada de música?
Eyta, acho que não. Todo mundo entende algo de músyca. A meu ver musyca é mayor que o entendimento…
14. Você acha que a indústria musical está realmente aberta para a música indígena contemporânea ou ainda há muito preconceito a ser superado?
Não fazemos Arte para fazer parte da Yndustrya. Acho que são bem antagonystas. Mas PRECYSAMOS estar para sobrevyver e dar contynuydade ao nosso modo de exystyr. Estamos aprendendo a ser mýdya. Somos um paýs colonyal, não posso ser yngenuo de querer estar onde foy construýdo pra me matar.
Estamos cryando nosso nycho, nosso públyco e nosso mercado. Sempre fyzemos algumas concessões, o mercado terá que ceder também.
15. Qual é a sua opinião sobre artistas não indígenas que se apropriam de elementos da cultura indígena em suas obras?
Não perco mays meu tempo com as falsyfycações Ydeológycas que são o status quo desse paýs. O branque nunca foy proybydo de nada. A gente vay seguyr fazendo nossas coysas e se apropryando dos mundos não yndygenas e não queremos ser questyonados por ysso, porque até se tomassem tudo a dývyda hystóryca não estarya paga.
16. Você sente que o público em geral entende a profundidade das questões indígenas abordadas no seu álbum, ou ainda há um longo caminho a percorrer?
Tenho encontrando públycos yncrýveys. Torço pra quem as pessoas atravessem o espelho e olhem para além da fronteyra do ymagynáryo delas. Mas só elas podem fazer ysso por sy e a únyca saýda é entregando-se a coletyvydade. A saýda é a auto-formação coletyva, a gente ensynando e aprendendo mutuamente. Temos um longo passado pela frente como dyz algum pensador. Não estou com pressa, quero que eles freyem e parem de achar que estão a frente num mundo onde todos temos que estar lado a lado.
17. Como a sua formação em teatro influenciou a sua abordagem na música?
Ynfluencyou em todos os aspectos poéticos e estétycos. Sou um contador de hystóryas. Mas sempre convydo o espectador/leytor/ouvynte a cocryar.
18. Olhando para trás, como você vê a evolução da sua carreira desde os primeiros shows até o lançamento de “NHE’ETIMBÓ”?
Eu era melhor antes. Hoje tenho mays estrutura e estratégyas pra ser menos bom e aynda assym poder seguyr.
19. Quais são os próximos passos para Juão Nÿn após o lançamento deste álbum?
Se for na músyca eu já tenho o 2° álbum em TUPI conceytualmente planejado. Se for na Arte: o meu