Entrevista: Chucky Ramyrez e os Traidores do Moviment

O nome do EP Mundo Virtual, Tragédia Real já é bastante provocativo. Como vocês chegaram a esse título e o que ele representa pra banda?
Bom, Cyber Loucura fala do impacto das redes sociais em nossas vidas, em como a sociedade adoeceu com essas merdas tá ligado? Tipo, porra! Algo que deveria ser para nos unir acabou nos separando e nos colocando uns contras outros. Despertou, ou apenas deu voz ao ódio das pessoas. A gente falhou pra caralho enquanto humanidade. Peter Punk, que fala de envelhecer, indiretamente também fala sobre isso, pq eu sou da época dos primórdios da internet. Entendo que não dá para por o gênio de volta na garrafa, mas puta que o pariu, o bagulho tá doido!
Então queria um título que resumisse isso, como as pessoas enlouqueceram na internet e trouxeram essa loucura para o “mundo real”. Pessoas preconceituosas, racistas, homofóbicas, machistas e por aí vai tiveram voz nessa porra e levaram essa violência pro mundo rela, pra política. Caralho véio, político agora além de roubar, fica fazendo corte pra merda de rede social e o país tá se fudendo. Aê Leis, projetos importantes para o país ficam pra escanteio pq o filho da puta quer é lacrar na porra das redes!
A ideia para o EP nasceu numa conversa de bar. Você lembra qual foi o estalo que te fez perceber que aquilo precisava virar música?
Sei lá bwahahahahahahahahahahah! Eu tava bêbado! Mas independente da ideia nascer no boteco, esse tema sempre vem à tona em conversa com amigos e a banda. Era algo que eu precisava falar tá ligado? Tipo por o demônio que me atormentava pra fora.
Vocês abrem o EP com Cyber Loucura, uma faixa que mergulha fundo no tema das redes sociais e das teorias da conspiração. Por que começar com essa música?
Ah, por vários motivos. Pq se conecta com o título do EP, pq estamos vivendo um período tenso pra caralho com ódio crescendo nas redes sociais e se espalhando pelo mundo real, isso muito alimentado por fake News e teorias doidas. Pode parecer louco, mas eu conheço uma cara que realmente acredita que a Terra é plana! Caralho mano! É sério. Conheço outro que realmente acreditava que a vacina tinha chip pra nos controlar e alterar o DNA. Ele dizia que era para a China nos tornar comunistas. E nada fazia ele mudar de ideia!
Uma vez num churrasco com galera de bandas e amigos das bandas, conheci um cara negacionista do aquecimento global!
Então achei começar o EP com os dois pés na porta e mandar essa pedrada, que embora seja com tom de ironia, bem divertida para quem entende ironia claro, pq hoje em dia tá foda, ninguém entende uma porra de ironia, queria logo mostra a que a gente veio.
O disco passeia por temas como adoecimento digital, fascismo, envelhecimento e até paixão por quadrinhos. Como vocês equilibram esses assuntos tão diversos mantendo uma identidade sonora coesa?
Porra, sei lá! Bwahahahahahahahahahahah Brincadeira, acho que é pq depois de milianos nessa porra de underground, música independente sempre fazendo a mesma merda, não tem como ser diferente bwahahahahahahahahahahahahah
Mas sério, é só que faço. Escuto várias paradas além do Punk Rock ou mesmo o Rock de forma geral, mas amo Punk Rock. É o que eu faço. O bom é que os outros Traidores também colocam suas influências nas composições. Levante, Avante mesmo tem uma introdução com caixa marcial que é uma caixa que o Sonic usa quando toca Escola de Samba Salgueiro. Sério, ele toca na Salgueiro.
Em Levante, Avante vocês falam abertamente sobre o crescimento do fascismo. Qual a importância de manter a música como ferramenta de resistência hoje?
Acho que cada um tem sua opinião. Eu até tento respeitar a maioria, mas coisas como racismo, fascismo, LGBTQIAfobia e por aí vai não são opiniões. Então temos de combater sim.
E foda-se quem acha que música, arte não tem à ver com política. Caralho, tudo é política nessa porra. Nosso segundo EP, o AMOR, PROTESTO & SPRAY DE PIMENTA tinha letras falando de amor, mas com viés militante, pq nesse época o ódio estava tão intenso que o simples ato de amar era política. Infelizmente não mudou, ainda mais formas de amor que vão de encontro a visão estabelecida, calcada na visão cri$tã.
Então, acho que a arte, a música no nosso caso, é sim uma ferramenta de combate e resistência ao fascismo, ao ódio. A música não muda o mundo. Mas muda as pessoas. E essas mudam a porra do mundo.
E eu acho sim, que todos tem de se posicionar. Primeiro que quem fica em cima do muro toma tiro dos dois lados. Segundo que quem fala em ser neutro, ainnn.. “sou nem de esquerda nem de direita”, geralmente é a porra de um ultradireitista flertando o fascismo, amante de bilionário que faz saudação romana!
Em Peter Punk há uma reflexão sobre envelhecer sem deixar de ser quem se é. Como é pra vocês, que vieram dos anos 90 e continuam ativos, ver o punk resistir em 2025?
Então, é um pouco mais complexo que isso. Não é só sobre não deixar de ser quem é, Entender com a porra que é envelhecer nesse mundo. Tem uma parte que canto “Lutei com monstros e não ganhei / Não sou que eu queria ou evitei”
É tipo, caralho eu queria ser como eu era, mas a porra do mundo muda a gente. A gente vira algo diferente e tem de aprender a lidar com o que nos tornamos. É foda mano.
Perdido também fala disso, mas com foco em outra situação, mas quando canto “ Mas é muito difícil não mudar / Vivendo os dias nesse mundo / por mais que eu tente, a vida / Ela me dobra e me deforma” ela mostra que a gente não consegue seguir o que planejamos ser quando jovens. Mas tá tudo bem, a gente só tem de se adaptar a merda da sociedade, do capitalismo, mas sem perder a porra da essência tá ligado? Sem perder o nosso jovem interior.
O espírito ‘do it yourself’ está muito presente desde a composição até a gravação. Como funciona na prática esse processo colaborativo entre você, Sonic e Espaguete?
Pô então, acho que agora chegamos à uma formula manera pra caralho pra compor. Tipo, às vezes eu começo com base num tema, às vezes uma ideia prum refrão. Ou um início de letra. Outras é um riff base que acho legal e vou trampando em cima disso.
Faço a letra e mando pro caras pelo grupo do zap pra ver o q eles acham. Aê vou trampando a melodia, a harmonia em cima da letra, adapto os acordes pra encaixar e tals. Faço o “esqueleto” da música tá ligado? Aê posso gravar uma base só com o baixo e voz e mando no zap de novo. Aê o Sonic e o Espaguete vão escutando e tendo ideias. Mas eu também vou falando o que eu gostaria que eles fizessem. E eles fazem melhor
bwahahahahahahahahahaah.
Aê fazemos uns ensaios e tals. Geralmente incluímos algumas dessas músicas nos shows pra gente ir vendo a reação do público e tals.
Já tando redondo, gravamos a bateria. Gravamos no estúdio, pode ser geral junto ou só eu e o Sonic. Nessa hora é foda bwahahahahahahahahah, pq o Sonic toca pra caralho, então ele vai inventando criando mais coisas e deixa pra eu me fuder em criar algo no baixo que não fique tão ruim depois, pq eu toco mal mesmo. Foda-se.
Aê pegamos as tracks da bateria gravada e trazemos pro nosso home-studio, a Punk House. Faço uma pré-mix da batira e parto pra gravar o baixo. O Espaguete vem depois gravar a guita. Vou dando ideias, como queria que fosse e o moleque vai dando mais ideias. Ele é foda. O moleque é brabo na guitarra. Geralmente fica melhor do que eu imaginava.
Aê é hora de gravar as vozes, backing vocals, outros elemento como a caixa da Salgueiro ou o saxfone no EP anterior. Aê vem mixagem, masterização, …
Tudo feito aqui na Punk House. Vou mandando prévias das mixagens pelo zap pros Traidores darem opiniões e vamos ajustando. É assim.
Ter home-studio ajuda pra caralho, pq a maior merda é ter a porra do tempo corrido por não ter grana e a hora no estúdio ser cara.
Vocês gravaram parte do EP em home studio e outra no Calabouço Estúdio. Como equilibram a técnica com a espontaneidade que o punk pede?
Técnica? Bwahahahahahahahaahahhahahahahah Então como eu disse, o fato de não ter de fazer as porras na pressa, dá chance da gente se soltar mais. Acho que ajuda na criatividade. A espontaneidade flui melhor com a cara cheia de cerveja que é mais barata comprando no mercado do lado de casa que pagando mais caro no estúdio bwahahahahahahahah
E a gente se solta mais. Dá pra experimentar mais. Em Peter Punk por exemplo, tem um “pau de chuva”, que o Sonic fez aki na hora, pegando um tubo de papelão e colocando arroz dentro.
E pra manter a energia, tanto eu quanto o Espaguete tentamos na maior parte das gravações gravar em pé, como se estivéssemos em show.
A gente percebe que a cerveja é quase um coadjuvante nas gravações e nas ideias. Ela realmente ajuda a soltar a criatividade ou às vezes atrapalha um pouco? (risos)
Bwahahahahahahahahahahah Ela é nosso combustível!!!! Sem ela não rola!
O clipe de Cyber Loucura tem uma pegada bem intensa. E agora vem aí Peter Punk, com referências a Matrix e Tron. Como vocês conectam o audiovisual com a mensagem da música?
Então, de novo a pobreza bwahahahahahahaahah. Tipo, cada clipe tem uma pegada que depende dos recursos que temos a disposição. Cyber Loucura, uma grande amiga a Isabella Tavares abraçou a causa chamou um amigo dela pra filmar e mais dois amigos atores para participar. Escrevi o roteiro e ela foi ajustando. Ela dirigiu e também atuou, ela faz o agente do governo no traje de radiação.
Já Peter Punk, a ideia era outra bem diferente gravamos cenas no estúdio Calabouço e aqui na Punk House, mas o chroma key ficou uma merda! Eu fiquei tipo, puta mano… fudeu. Não vai dar pra usar.
Mas brincando com o que tinha de gravação, fui testando efeitos e pensei… mano, a música fala de envelhecer, mas estamos envelhecendo num mundo ligado por redes sociais. Sem saber direito o que é real. É tipo uma simulação. Como a Matrix!
Aê, isso se conectava com a ideia do nome do EP. Pensei, caralho, é isso. Vou fazer assim pra tentar salvar essa merda pq não temos dinheiro pra ir pro estúdio de novo, esticar a merda da cortina verde, cortina azul e ficar uma merda de novo bwahahahahahahah.
Você também é responsável pela direção dos vídeos. De onde vem esse desejo de controlar todo o processo criativo, da música às imagens?
Da pobreza bwahahahahahahahahahahahahah. Ou a gente faz por nós mesmo ou então não faz. Não temos como pagar alguém pra fazer clipes. Nem pra gravar, mixar, …
E eu tenho mais conhecimento com os programas de edição de vídeos, de gravação/mixagem, … Então não teve jeito, alguém tinha que se fuder bwahahahahahahahahahahah
Mas acho também importante alguém numa banda ter essa vibe, principalmente quando não se tem grana. Aê posso deixar outras tarefas pros caras. A gente se equilibra nas funções.
A faixa Louco por Quadrinhos é uma homenagem explícita. Quais quadrinhos ou personagens marcaram sua trajetória?
Ah véi… vários. Mas eu sou DCnauta assumido. Adoro o Arqueiro Verde, Lanterna Verde, Mulher-Maravilha, Superboy, Superman, Super-Choque, Flash, … Na época da Ramyrez fiz até música pro lanterna verde bwahahahahahahahahah
Você mencionou que mesmo envelhecendo, ainda curte rock, quadrinhos e cerveja. Quais coisas da juventude você carrega com mais orgulho até hoje?
Acho que o rock, quadrinhos e cerveja! Bwahahahahahahahahahahah
Sério, o Rock e os quadrinhos ajudaram a moldar quem eu sou. Mas também me orgulho de manter o espírito jovem, a zueira. Apesar ter a responsabilidade da vida “adulta”.
Pô, uma vez tinha postado numa dessas redes sociais de bilionários de merda que ia num show em Caxias, depois ia para outro em São Gonçalo e terminaria a noite em outro no centro do Rio. Tudo banda autoral! Aê um amigo respondeu que tinha ficado cansado só de ler bwahahahahahaahah
Na noite que conheci minha esposa, eu fui em show que um amigo insistiu deu ir, era na rua Ceará, o famigerado Garage, Era sábado. Eu disse que queria voltar cedo. Saí de lá às onze horas. Do dia seguinte. Da noite. De domingo bwahahahahahahahahahahahahahah. Cheguei às 21h de sábado e saí às 23h do domingo. Então acho que essa energia de ter um jovem interior, gostar de curtir a noite, viajar, zoar, mas manter o equilíbrio com trampo e as responsabilidades de “adulto” são motivo de orgulho.
Sua trajetória passa por várias bandas como a Lapisdicore, Sheet, Psiquê Distorcida e Ramyrez 77. O que Os Traidores do Movimento têm que as outras não tinham?
Pô, então… Lápisdicore foi minha primeira banda, abusando do direito de usar o termo banda. Bwahahahahahahahahahah. Era ruim pra caralho, ninguém sabia tocar, era só barulho e gritaria mesmo. Sheet foi onde comecei a tocar baixo, o Eddie da Blind Horse que me chamou, mesmo sem eu nunca ter pego num baixo! Mas não ra o som que eu queria fazer. Era um Grunge e tals.
A Psiquê Distorcida era um hardcore punk. Era bem legal, mas infelizmente não durou muito por conta de vários problemas de que quem tem banda sabe bem bwahahahahahah
Já a Ramyrez 77, bom essa era meu bebê. A banda que criei e durou mais de 20 anos! Mas de novo, problemas de banda, toda hora saia alguém pelos mais variados motivos, mudança pra outro estado, trabalhar, casamento, mudança de país, …
Então com os Traidores, eu decidi que teria o controle criativo nas minhas mãos, na Ramyrez a maioria das músicas eram minhas mesmo, até pq na Ramyrez tive problemas desse tipo também, tipo… teve gente que entrou na banda sabendo que era uma banda de punk rock 77 e quis mudar o estilo e fazer uma parada heavy metal. Bwahahahahahahahahahahah puta merda. E ainda conseguiram me expulsar da minha própria banda pra tentar mudar o estilo, usando a desculpa que eu bebia de mais. Não deu certo, ninguém curtiu e eu consegui pegar o nome de volta.
Também teve uma vez que uma outra pessoa que entrou depois quis tomar o controle da banda, e olha que eu mesmo liderando a banda, sempre ouvia opinião de todos, todos podiam compor pra banda e tals. Bom aí acabei ficando puto.
Um dia quando uma outra pessoa saiu da banda eu fiquei tipo… mano, melhor eu fazer uma parada “solo”. Tipo, se sair um, entrar outro foda-se. A banda se mantém.
Só que eu gosto de banda, então o projeto solo acabou sendo família mesmo. Mesmo quem saiu dos Traidores continua tendo contato, vem pra churrasco. O Hugo mesmo que gravou a maioria das guitarras do segundo EP e tocou com a gente até em SP mais de uma vez, quando saiu da banda pra tocar metal, saiu deixando o aluno dele, o Hugo é professor de música, então ele que apresentou a gente pro Espaguete, que era aluno dele. E o Espaguete ficou perfeito na banda! O moleque é brabo! Então agora com ele e o Sonic que é o melhor baterista de Punk Rock do RJ, a parada tá foda!
Como vocês veem a cena atual da chamada Nova Onda do Rock Carioca (NORC) e onde se encaixam dentro dela?
Existe isso? Nem tava sabendo bwahahahahahahahahah Acho que a gente é excluído mesmo. Mas acho legal a cena carioca esteja se renovando. Tomara que tenha espaço pra noix bwahahahahahahahahah
O que vocês esperam que as pessoas sintam ou pensem ao ouvir o Mundo Virtual, Tragédia Real?
Se não vomitarem ou mandarem mensagens xingando minha mãe acho que já bom bwahahahahahahahahah
Já tem show ou turnê no radar pra divulgar o EP? E o que o público pode esperar dessas apresentações?
Mano, saporra de shows quem marca é a Bonde Music. Eles que nos agenciam. Coitados bwahahahahahahahah.
Agora quanto ao que esperar, esperem só doideira, gente jogando cerveja nos outros, a gente se jogando do palco e entrando na roda com instrumento e tudo, fazendo merda. É só energia pura e falta de noção Bwahahahahahahahahahah
Ah, esqueci, a Bonde Music tá organizando um show com gravação Ao Vivo. Acho que pra junho ou julho. Tô bêbado, num lembro. Caralho, tô bêbado. E é terça-feira…
Por fim: qual mensagem vocês deixariam pra quem ainda acredita que punk é só barulho e rebeldia sem causa?
Que vá ouvir sertanojo então porra! Bwahahahahahaahahah
Mas sério, tem punk que é barulho, e tá tudo bem. Tem punk mais trabalhado e está bem também. Não tem de ter regra ou caixinha.
Quanto a rebelde sem causa? Pô, o que mais tem é causa! Onde esse povo vive? Não estão vendo como está o mundo? Como capitalismo está acabando com a vida no planeta? Caralho, eu acho que falta é mais rebeldia nesse mundo, principalmente no Rock. E até rebeldia sem ser “politizada”! Embora tenha muita banda foda pelo underground! Muita banda com essa tal rebeldia. O que falta mesmo é a galera escutar as bandas novas que estão a luta!
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E desculpe, pq falei pra caralho bwahahahahahahahahah! Eu falo muito!