Entrevista: Manuela Rodrigues, cantora e compositora

O álbum “Manu” tem um título bem pessoal. O que essa escolha representa para você neste momento da sua trajetória artística?
Ao longo do tempo passei a ser chamada assim tanto no meio musical quanto pelo público que acompanha o meu trabalho. Nesse disco compartilho o meu olhar, bem pessoal mesmo, sobre a nossa vida contemporânea, a narrativa é em torno dessa observação de como essa forma de viver corrida reverbera em mim. Me sinto compartilhando algo íntimo e acho que as pessoas irão se reconhecer também através das canções.
Você menciona que este disco tem uma abordagem mais íntima e reflete sua trajetória. Como foi o processo de composição dessas sete faixas?
Três delas fiz anteriormente e outros artistas gravaram antes que eu. A canção “Cabe um tanto” foi gravada pela cantora Claudia Cunha em seu primeiro CD, a canção “Sou de água” foi gravada por Ian Cardoso, que é meu parceiro nessa composição, e a canção “Nobre mulher” foi gravada por Aiace. Nesse disco achei que tinha a ver trazer minhas versões dessas composições.
As outras quatro compus em períodos diferentes, estimulada por situações diferentes. A canção “Deixa os Ets”, por exemplo, veio a partir do pedido da cantora Xenia França para uma música inédita e ela acabou não gravando e eu resolvi gravar.
A instrumentação do álbum traz mudanças importantes, como a troca da guitarra pelo violão. Como essa escolha influenciou a sonoridade do trabalho?
Já vinha com esse desejo de introduzir o violão no meu trabalho, comecei a tocar algumas músicas em shows em duo com o violonista Ruan de Souza e gostei de como as músicas começaram a soar. Um pouco menos pesadas. Amo a guitarra, penso que essa mudança teve a ver com a concepção desse disco. O som ficou bem híbrido, soa brasileiro, mas os arranjos trazem de um tudo.
Você destaca que sua voz neste álbum se expressa antes de buscar o belo ou a perfeição. Pode contar mais sobre essa abordagem vocal?
Me conecto muito com a letra da canção e com a atmosfera que desejo transmitir, se para transmitir o que vem em mim o som é um pouco mais sujo, eu deixo, não procuro corrigir para que ele chegue a uma perfeição sonora. Gosto das imperfeições humanas, senão fica parecendo IA.
O álbum conta com participações especiais de Ailton Krenak, Fabiana Cozza, Zé Manoel e Jadsa. Como essas colaborações aconteceram e o que cada um trouxe para o projeto?
A de Ailton Krenak foi a mais surpreendente para mim, tentei meio achando que não ia rolar porque para mim ele é um ser gigante, uma das personalidades mais importantes do nosso país. Enviei um e-mail à equipe dele pedindo que ele autorizasse uma fala dele na música “Minimalista”, quando recebi a autorização dele saí gritando pela rua de felicidade. Zé Manoel, Fabiana Cozza e Jadsa fiz o convite diretamente a eles e todos toparam de primeira.
A faixa “Minimalista” traz um discurso de Ailton Krenak. Como surgiu essa ideia e qual a importância dessa participação para a mensagem da música?
Afe Maria. A importância é gigantesca não só pela presença de Ailton Krenak no álbum, mas pelo que é dito por ele sempre. A ideia veio depois de ver um vídeo de uma palestra dele, onde o que ele dizia dialogava diretamente com a música, que fiz inspirada em vários vídeos dele.
“Sou de água”” é a única parceria na composição do álbum, feita com Ian Cardoso e interpretada com Zé Manoel. Como foi esse processo colaborativo?
Escrevi a letra de “Sou de água” e postei, Ian Cardoso viu e fez a melodia de imediato, assim nasceu a canção. O convite para Zé Manoel veio após ouvir a música depois do arranjo pronto, achei que a atmosfera tinha muito a ver com ele. Somos amigos, fiz o convite e ele topou.
O álbum reflete sobre a vida contemporânea, excesso de informação e busca por essencialidade. Como esses temas apareceram na sua criação?
Acho que são temas que cercam o meu ser, rs. Estou sempre refletindo sobre a existência e por vezes alguns aspectos chegam mais forte. Às vezes, por uma situação do dia a dia.
“Deixa os Ets” fala sobre redes sociais e algoritmos. Qual sua relação com o mundo digital e como isso impactou sua composição?
Acho que sempre trouxe essa temática nas minhas composições, tenho algumas, “Rede social”, “Siga na pista”, “Olhe pra cara das pessoas”. “Deixa os Ets” fala um pouco sobre estarmos reféns dos algoritmos e desconectados de nós, de como estamos integrados ao planeta, ao universo.
Você estudou música em New Orleans e tem uma trajetória de experimentação. Como essas experiências influenciam sua sonoridade até hoje?
Sim. Já tem um tempo. Tudo vira experiência. Foi uma vivência importante, estudei lá aos 21 e vim usando o que aprendi lá misturado a tudo que aprendi aqui. Ter tido essa experiência foi importante no lado pessoal porque entendi melhor quem eu era.
Antes do lançamento oficial, você fará uma audição pública na Casa da Mãe. Como espera que o público receba o álbum nessa experiência coletiva?
Estou nervosa, rs. Nunca fiz isso antes, mas acho que vai ser muito bom ouvir o retorno das pessoas ali na hora.
Você se mantém ativa na música de forma independente há 25 anos. Como enxerga o cenário atual para artistas independentes no Brasil?
Acho que tem muitos artistas incríveis e diversidade, mas sinto que há uma dificuldade em furar a bolha.
Quais são seus planos para depois do lançamento de “Manu”? Podemos esperar apresentações ao vivo e turnês?
Sim. Esse é o planejamento. Queremos levar o show de lançamento para São Paulo, circular o Brasil e fechar em Salvador.